Esconomia & Negócios
21/05/2010
Por Ricardo Amorim
Vulcões e Revoluções
RICARDO AMORIM – O Estado de S.Paulo
Muito se tem falado sobre as dificuldades e riscos fiscais e políticos que a Europa enfrentará no seu processo de ajuste financeiro ao longo dos próximos anos. Quero, aqui, adicionar mais uma variável de risco sócioeconômico, potencialmente importante: o risco vulcânico.
Na semana passada, nuvens de cinzas expelidas pelo vulcão islandês Eyjafjallajokull forçaram vários aeroportos europeus a fechar novamente. Há um mês, uma erupção do mesmo vulcão manteve praticamente todo o espaço aéreo europeu fechado por seis dias, forçando o cancelamento de mais de 100 mil voos e causando prejuízos estimados em US$ 6 bilhões apenas na indústria de aviação. Se considerarmos todos os prejuízos humanos e financeiros na economia europeia em razão das muitas pessoas impossibilitadas de viajar por causa do apagão aéreo, os números são exponencialmente maiores.
Ainda assim, as consequências econômicas, sociais e ecológicas causadas ao longo do último mês pela erupção de vulcões na Islândia podem vir a se mostrar absolutamente irrisórias em relação ao que pode vir por aí.
Vulcões podem ter impactos climáticos e, por consequência, sócioeconômicos, substanciais. Em 1991, uma erupção de meras nove horas do Monte Pinatubo, nas Filipinas, lançou à atmosfera uma quantidade tão grande de dióxido de enxofre que – ao bloquear os raios solares – causou uma redução da temperatura média do planeta nos cinco anos seguintes de meio grau centígrado, até que a névoa sulfúrica se desfizesse. Pode parecer pouco, mas meio grau centígrado equivale a todo o aquecimento do planeta nos 100 anos anteriores.
Apesar de todo o estrago causado por ele, o Eyjafjallajokull não passa do irmão menor de 3 dos 33 outros vulcões islandeses que entraram em erupção pelo menos uma vez após o final da última era do gelo, há cerca de 12 mil anos: Oraefajokull, Laki e Katla.
A erupção do Oraefajokull em 1362, por exemplo, parece ter sido maior ou no mínimo equivalente à do Vesúvio em 79 a.C., que riscou as cidades de Pompeia e Herculano do mapa.
Em 1873, o Laki manteve-se em erupção por oito meses, causando um forte resfriamento da temperatura do continente e ilhas europeias, segundo os climatologistas. A redução das temperaturas e a fumaça tóxica causaram a morte de um em cada cinco islandeses naquele momento. Mais do que isso, as mudanças climáticas causaram uma redução tão dramática da produção agropecuária europeia nos anos seguintes que, segundo alguns historiadores, foi decisiva para o mal-estar social que foi o estopim da Revolução Francesa em 1789.
Algumas décadas antes, no início do século 18, uma erupção de outro dos irmãos maiores do Eyjafjallajokull, o Katla, causou um resfriamento global tão significativo que até o Rio Mississippi, que se encontra em uma das regiões mais quentes dos Estados Unidos, chegou a congelar ao norte de New Orleans.
Segundo alguns vulcanologistas – só descobri que a especialidade existe agora – as erupções do Eyjafjallajokull costumam ser indicadores de que o Katla entrará em erupção em breve, pois vulcões vizinhos muitas vezes têm “encanamentos” comuns. Para piorar, a próxima erupção do Katla já está atrasada. A última ocorreu em 1918 e ele, normalmente, entra em erupção em intervalos de 30 a 80 anos. Alguns especialistas acreditam que o atraso possa causar uma erupção ainda mais violenta quando, finalmente, ela ocorrer. Para se ter uma ideia do potencial de devastação, as erupções “usuais”do Katla chegam a ser 100 vezes maiores do que as do Eyjafjallajokull.
Some-se aos potenciais impactos climáticos e econômicos de uma eventual erupção do Katla a já catastrófica situação econômica e tensa situação sóciopolítica da Europa e o caldo de mudanças profundas pode estar pronto.
Venho alertando há vários meses em minha coluna na Rede Eldorado sobre o grande risco de esfacelamento da zona do euro. Políticas cambial e monetária comuns são incompatíveis com soberania política e fiscal no longo prazo. Nenhuma das medidas adotadas pela União Europeia até agora lida com essa incompatibilidade.
Talvez seja um vulcão que jogue uma pá de cal ou, mais precisamente, uma pá de enxofre na utopia da zona do euro e force a Europa a adotar uma nova forma de organização econômica. Seja bem-vinda a Revolução Vulcânica.
ECONOMISTA, PRESIDENTE DA RICAM CONSULTORIA, APRESENTADOR DO PROGRAMA MANHATTAN CONNECTION DO GLOBONEWS E COLUNISTA DA REVISTA “ISTOÉ”.
Na semana passada, nuvens de cinzas expelidas pelo vulcão islandês Eyjafjallajokull forçaram vários aeroportos europeus a fechar novamente. Há um mês, uma erupção do mesmo vulcão manteve praticamente todo o espaço aéreo europeu fechado por seis dias, forçando o cancelamento de mais de 100 mil voos e causando prejuízos estimados em US$ 6 bilhões apenas na indústria de aviação. Se considerarmos todos os prejuízos humanos e financeiros na economia europeia em razão das muitas pessoas impossibilitadas de viajar por causa do apagão aéreo, os números são exponencialmente maiores.
Ainda assim, as consequências econômicas, sociais e ecológicas causadas ao longo do último mês pela erupção de vulcões na Islândia podem vir a se mostrar absolutamente irrisórias em relação ao que pode vir por aí.
Vulcões podem ter impactos climáticos e, por consequência, sócioeconômicos, substanciais. Em 1991, uma erupção de meras nove horas do Monte Pinatubo, nas Filipinas, lançou à atmosfera uma quantidade tão grande de dióxido de enxofre que – ao bloquear os raios solares – causou uma redução da temperatura média do planeta nos cinco anos seguintes de meio grau centígrado, até que a névoa sulfúrica se desfizesse. Pode parecer pouco, mas meio grau centígrado equivale a todo o aquecimento do planeta nos 100 anos anteriores.
Apesar de todo o estrago causado por ele, o Eyjafjallajokull não passa do irmão menor de 3 dos 33 outros vulcões islandeses que entraram em erupção pelo menos uma vez após o final da última era do gelo, há cerca de 12 mil anos: Oraefajokull, Laki e Katla.
A erupção do Oraefajokull em 1362, por exemplo, parece ter sido maior ou no mínimo equivalente à do Vesúvio em 79 a.C., que riscou as cidades de Pompeia e Herculano do mapa.
Em 1873, o Laki manteve-se em erupção por oito meses, causando um forte resfriamento da temperatura do continente e ilhas europeias, segundo os climatologistas. A redução das temperaturas e a fumaça tóxica causaram a morte de um em cada cinco islandeses naquele momento. Mais do que isso, as mudanças climáticas causaram uma redução tão dramática da produção agropecuária europeia nos anos seguintes que, segundo alguns historiadores, foi decisiva para o mal-estar social que foi o estopim da Revolução Francesa em 1789.
Algumas décadas antes, no início do século 18, uma erupção de outro dos irmãos maiores do Eyjafjallajokull, o Katla, causou um resfriamento global tão significativo que até o Rio Mississippi, que se encontra em uma das regiões mais quentes dos Estados Unidos, chegou a congelar ao norte de New Orleans.
Segundo alguns vulcanologistas – só descobri que a especialidade existe agora – as erupções do Eyjafjallajokull costumam ser indicadores de que o Katla entrará em erupção em breve, pois vulcões vizinhos muitas vezes têm “encanamentos” comuns. Para piorar, a próxima erupção do Katla já está atrasada. A última ocorreu em 1918 e ele, normalmente, entra em erupção em intervalos de 30 a 80 anos. Alguns especialistas acreditam que o atraso possa causar uma erupção ainda mais violenta quando, finalmente, ela ocorrer. Para se ter uma ideia do potencial de devastação, as erupções “usuais”do Katla chegam a ser 100 vezes maiores do que as do Eyjafjallajokull.
Some-se aos potenciais impactos climáticos e econômicos de uma eventual erupção do Katla a já catastrófica situação econômica e tensa situação sóciopolítica da Europa e o caldo de mudanças profundas pode estar pronto.
Venho alertando há vários meses em minha coluna na Rede Eldorado sobre o grande risco de esfacelamento da zona do euro. Políticas cambial e monetária comuns são incompatíveis com soberania política e fiscal no longo prazo. Nenhuma das medidas adotadas pela União Europeia até agora lida com essa incompatibilidade.
Talvez seja um vulcão que jogue uma pá de cal ou, mais precisamente, uma pá de enxofre na utopia da zona do euro e force a Europa a adotar uma nova forma de organização econômica. Seja bem-vinda a Revolução Vulcânica.
ECONOMISTA, PRESIDENTE DA RICAM CONSULTORIA, APRESENTADOR DO PROGRAMA MANHATTAN CONNECTION DO GLOBONEWS E COLUNISTA DA REVISTA “ISTOÉ”.