03/2015
O governo tem anunciado muitas medidas para amenizar a crise econômica que se instala no país, pensando no bolso da população e com altos encargos para empresas. O que os empresários ainda devem esperar para 2015?
Estas medidas têm de corrigir uma série de desequilíbrios que se formaram principalmente nos últimos quatro anos. Infelizmente, 2015 será mais um ano difícil, com uma pequena queda do PIB. Os ajustes necessários são dolorosos. Como um doente que tem câncer e precisa passar por uma quimioterapia, antes de nos sentirmos melhor, vamos nos sentir ainda pior do que antes por conta dos efeitos colaterais do tratamento.
O ajuste das contas públicas, por exemplo, é inevitável, mas o aumento de impostos e o corte de gastos públicos são inicialmente recessivos, retirando dinheiro da economia em 2015, também limitando o crescimento.
Além disso, um racionamento brando de água e energia elétrica deveria ter começado no ano passado, forçando empresas e pessoas a reduzirem o consumo de água e energia. No entanto, como era um ano eleitoral, não só isto não aconteceu, mas tanto o governo federal quanto os estaduais esconderam a gravidade do problema, fazendo com que empresas e pessoas físicas não se preparassem para lidar com ele. Por isso, o ajuste agora terá de ser muito mais radical, com consequências muito mais drásticas. No caso do setor elétrico, há outra causa ainda mais grave. A crise atual foi causada em grande medida pela desastrada tentativa do governo de reduzir o preço da energia no Brasil, que reduziu sensivelmente a rentabilidade no setor, levando a redução de investimentos em geração e transmissão de energia, que se tivessem ocorrido, teriam nos deixado em uma situação muito mais confortável agora.
No entanto, se arrumarmos a casa em 2015, retomando a confiança de empresários e consumidores, podemos retomar um ciclo de crescimento mais acelerado no final do ano e nos anos seguintes. Em resumo,
Há alguma oportunidade que os setores de comércio, indústria e serviços podem tirar deste momento?
Há muitas oportunidades em todos os setores, mas as expectativas para os setores de comércio e serviços ainda que piores do que eram até 2012, são bem melhores do que para a indústria. A desaceleração econômica atingiu todos os setores em 2014 e em 2015 não deve ser diferente, mas ao contrário da indústria que sofre concorrência direta com produtos estrangeiros, boa parte dos setores de serviços e comércio está blindada da concorrência externa e, por isso, tem um desempenho melhor. Exatamente por isso, desde 2004, em todos os anos sem exceções, o crescimento dos setores de comércio e serviços foi maior do que o da indústria e em 2015, não deve ser diferente.
Independentemente do setor, há uma grande oportunidade de se fazer ajustes que permitirão um crescimento mais acelerado e sustentado quando a situação econômica melhorar. Nos períodos de bonança, o barco se move rapidamente sem que sequer tenhamos de cuidar de suas velas. Tornamo-nos displicentes, preguiçosos e acomodados. Com a economia crescendo 5% a.a. em média entre 2004 e 2008, dezenas de milhões de brasileiros sendo incorporados aos mercados de trabalho e de consumo e a demanda por produtos brasileiros no exterior batendo recordes, salários subiam acima da inflação, os lucros das empresas cresciam e os desequilíbrios das contas públicas pareciam controlados, apesar de corrupção e gastos galopantes.
O cessar dos ventos, ou neste caso do crescimento, expôs a insustentabilidade destas situações. Salários só sobem acima da inflação se a produtividade cresce. Para ganhar mais, o trabalhador tem de produzir mais. Caso contrário, seu produto ou serviço ficará cada vez mais caro e acabará não sendo mais comprado, a empresa perderá dinheiro e o trabalhador, o seu emprego. Sem nenhum programa nacional amplo e profundo de automação e qualificação de mão de obra, a produtividade brasileira estagnou desde 2011. É responsabilidade do governo e de cada empresa criar programas assim, mas, se queremos ganhar mais, também cabe a cada um de nós nos qualificarmos independentemente das políticas do governo e das empresas em que atuamos.
Nas empresas, o período de bonança levou muitas a esquecerem seus propósitos e focarem em ganhos de curto prazo. Adeus inovações, melhoria de processos, produtos e serviços ou geração de oportunidades de crescimento para seus colaboradores.
As empresas que se perpetuam são aquelas capazes de se fortalecerem em ambientes desafiadores. Nos períodos de seca, os erros das épocas de abundância são expostos. Se corrigidos, o sucesso das empresas a longo prazo será garantido.
Enfim, é hora de controlar custos, evitar endividamentos excessivos e focar em inovações que melhorem a atratividade dos produtos e serviços que a empresa oferece para que ela saia fortalecida da crise.
Existe algum setor que deve sair fortalecido após essa crise? O que aproveitar depois de momentos tensos na economia?
Um setor que claramente deveria sair fortalecido passada a crise é a indústria. Há 11 anos, a produção da indústria brasileira cresce menos do que as vendas do varejo em função de políticas econômicas que privilegiavam apenas o consumo e não a produção. Precisamos retomar políticas que melhorem nossa competitividade.
No dia 2 de agosto de 2011, ele lançou o Programa Brasil Maior, voltado a aumentar a competitividade da indústria através de maior intervenção governamental. Desde então, a indústria encolheu. Desde o ano passado, o PIB também encolheu.
A estagnação reforçou ao menos três lições fundamentais. Primeiro, planejamento e gestão são imprescindíveis se não quisermos viver novas crises hídrica, hidrelétrica e outras. Segundo, um Brasil mais competitivo, rico e justo requer um Estado menor, menos oneroso à sociedade e mais eficiente. Terceiro, combater implacavelmente a corrupção é função de todo e qualquer governo e deve ocorrer em três frentes.
Para diminuir o volume de recursos acessível aos mal intencionados, precisamos reduzir o tamanho do Estado, sua participação direta na economia e os impostos. Segundo, a transparência das contas e negócios do setor público deve ser total para que a corrupção seja menor. Por fim, quando houver corrupção, as punições têm de ser draconianas.
Se o governo, as empresas e cada um de nós aproveitarmos estas oportunidades, este momento difícil da economia não terá sido perdido.
É possível vislumbrar alguma perspectiva de melhora para este ano ainda? Qual a tendência para os próximos meses?
Vai piorar antes de melhorar, mas pela primeira vez em cinco anos, podemos terminar o ano melhor do que começamos e com perspectivas melhores para os próximos anos. Se arrumarmos a casa em 2015, retomando a confiança de empresários e consumidores, podemos retomar um ciclo de crescimento mais acelerado no final do ano e nos anos seguintes.
Temos de separar 2015 dos anos seguintes. O desempenho da economia em 2015 será ruim. 2016 certamente será um ano melhor do que 2015, mas o quanto melhor dependerá da profundidade dos ajustes que forem feitos em 2016. Quanto mais profundos os ajustes em 2015, mais a economia sentirá neste ano, mas mais fortemente ela se recuperará em 2016 e nos anos seguintes. A questão é se faremos ou não os ajustes necessários para que os anos seguintes sejam melhores, possivelmente muito melhores. Ainda não temos uma resposta a esta questão. Por um lado, a nova equipe econômica tem o diagnóstico correto. Por outro, o apoio político, tanto por parte da Presidente quanto do Congresso à adoção das duras medidas necessárias, parece longe de garantido.
O que fazer para controlar a inflação , que vem mostrando índices preocupantes?
Infelizmente, a inflação não está apenas elevada, está grávida. O dragãozinho dos preços controlados pelo governo nasceu agora, após as eleições e ainda irá crescer antes de morrer. Há anos, os preços de ônibus, metrô, gasolina, energia elétrica e outros têm sido represados para conter a inflação e as manifestações de rua. Estes preços terão de ser realinhados para evitar o colapso dos serviços e contas públicas.
Só a diferença entre o preço internacional do petróleo e os preços nacionais de seus derivados custava à Petrobrás mais de R$ 40 bilhões anuais até o ano passado. Por isso, a elevação recente dos preços de derivados de petróleo. A utilização de usinas termoelétricas para geração de energia elétrica custará de R$ 20 bilhões a R$ 30 bilhões só neste ano. Parte deste custo deverá ser financiado com aumento do preço da eletricidade. Os reajustes pressionarão a inflação, forçando o Banco Central a aumentar ainda mais os juros, que já estão no nível mais alto em seis anos, limitando a expansão do crédito e reduzindo o crescimento econômico. Em resumo, a inflação deve se manter elevada, possivelmente, chegando até a casa dos 8% no caso do IPCA.
Ricardo Amorim é apresentador do Manhattan Connection da Globonews, colunista da revista IstoÉ, presidente da Ricam Consultoria, único brasileiro na lista dos melhores e mais importantes palestrantes mundiais do Speakers Corner e economista mais influente do Brasil segundo a revista americana Forbes.
Perfil no Twitter: @ricamconsult.