04/2014
Por Katia Simões
Foto: Ricardo Correa
O que podemos esperar da economia brasileira ainda neste semestre? E para o ano?
Neste primeiro semestre, é provável que haja comportamentos bastante distintos entre setores de bens não duráveis, como supermercados e farmácias, e os de bens duráveis, como o automotivo e o imobiliário. Com a confiança de consumidores nos níveis mais baixos da história, consumidores optam por adiar a troca do carro e da casa, impactando muito negativamente a venda destes produtos. Por outro lado, isto aumenta a renda disponível para gastos com produtos como alimentos e cosméticos, favorecendo o desempenho destes setores, o que aliás já aconteceu no primeiro trimestre.
Quanto ao ano, pela primeira vez em cinco anos, é provável que terminemos o ano melhor do que começamos e com perspectivas melhores para os próximos anos. Se arrumarmos a casa em 2015, retomando a confiança de empresários e consumidores, podemos retomar um ciclo de crescimento mais acelerado no final do ano e nos anos seguintes.
2016 certamente será um ano melhor do que 2015, mas o quanto melhor dependerá da profundidade dos ajustes que forem feitos em 2016. Quanto mais profundos os ajustes em 2015, mais a economia sentirá neste ano, mas mais fortemente ela se recuperará em 2016 e nos anos seguintes. A questão é se faremos ou não os ajustes necessários para que os anos seguintes sejam melhores, possivelmente muito melhores. Ainda não temos uma resposta a esta questão. Por um lado, a nova equipe econômica tem o diagnóstico correto. Por outro, o apoio político, tanto por parte da Presidente quanto do Congresso à adoção das duras medidas necessárias, parece longe de garantido.
Qual o caminho a ser trilhado pelas empresas para atravessar este momento de recessão?
Independentemente do setor, há uma grande oportunidade de se fazer ajustes que permitirão um crescimento mais acelerado e sustentado quando a situação econômica melhorar. Nos períodos de bonança, o barco se move rapidamente sem que sequer tenhamos de cuidar de suas velas. Tornamo-nos displicentes, preguiçosos e acomodados. Com a economia crescendo 5% a.a. em média entre 2004 e 2008, dezenas de milhões de brasileiros sendo incorporados aos mercados de trabalho e de consumo e a demanda por produtos brasileiros no exterior batendo recordes, salários subiam acima da inflação, os lucros das empresas cresciam e os desequilíbrios das contas públicas pareciam controlados, apesar de corrupção e gastos galopantes.
O cessar dos ventos, ou neste caso do crescimento, expôs a insustentabilidade destas situações. Salários só sobem acima da inflação se a produtividade cresce. Para ganhar mais, o trabalhador tem de produzir mais. Caso contrário, seu produto ou serviço ficará cada vez mais caro e acabará não sendo mais comprado, a empresa perderá dinheiro e o trabalhador, o seu emprego. Sem nenhum programa nacional amplo e profundo de automação e qualificação de mão de obra, a produtividade brasileira estagnou desde 2011. É responsabilidade do governo e de cada empresa criar programas assim, mas, se queremos ganhar mais, também cabe a cada um de nós nos qualificarmos independentemente das políticas do governo e das empresas em que atuamos.
Enfim, é hora de controlar custos, evitar endividamentos excessivos e focar em inovações que melhorem a atratividade dos produtos e serviços que a empresa oferece para que ela saia fortalecida da crise.
Quais os principais desafios a serem enfrentados durante o segundo governo Dilma?
Sem dúvida nenhuma, o maior desafio será enfrentar a crise política e, ao mesmo tempo, retomar a confiança de empresários e consumidores para investimentos produtivos e o consumo voltem a se fortalecer. Além disso, há um risco importante de racionamento de água e energia, caso as chuvas não ajudem.
Por fim, a economia mundial está vivendo um momento delicado, com os EUA tendo um desempenho favorável em 2014, mas a economia chinesa desacelerando, enquanto Europa, Japão, Brasil e Rússia viveram recessões.
Neste ano, o que se vê é o contrário, com sinais de desaceleração nos EUA, mas alguma recuperação na Europa e no Japão e a princípio a economia chinesa se estabilizando.
No entanto, há riscos importantes no cenário externo que, se concretizados poderiam desencadear uma nova crise financeira global, encarecendo muito e limitando temporariamente a oferta de recursos para financiamentos de empresas e cooperativas brasileiras – como o que aconteceu no final de 2008 e início de 2009. Só para ficar nos riscos mais importantes, podemos ter a saída da Grécia e, eventualmente outros países da Zona do Euro, uma eventual saída da Grã-Bretanha da União Europeia, uma crise imobiliária e de crédito na China e o estouro de uma bolha acionária nos Estados em resposta à elevação de juros por lá, sem nem falar em crises em países emergentes, como a Rússia, entre outros.
Quais segmentos da economia sofrerão maior pressão?
Os setores mais dependentes de crédito são os que mais sofrem quando uma crise de confiança como esta acontece. Por ordem, os setores imobiliário e automotivo são os mais atingidos e que terão um 2015 mais difícil. Nos dois casos, acredito que uma vez retomada a confiança, a recuperação deve ser forte até porque, quando isto acontecer, eles devem se beneficiar da volta ao mercado de um apetite por consumo reprimido a pelo menos dois anos, o que deve contribuir para um crescimento significativo da demanda.
Outro setor que claramente deveria sair fortalecido passada a crise é a indústria manufatureira. Há 11 anos, a produção da indústria brasileira cresce menos do que as vendas do varejo em função de políticas econômicas que privilegiavam apenas o consumo e não a produção. Precisamos retomar políticas que melhorem nossa competitividade.
No dia 2 de agosto de 2011, ele lançou o Programa Brasil Maior, voltado a aumentar a competitividade da indústria através de maior intervenção governamental. Desde então, a indústria encolheu. Desde o ano passado, o PIB também encolheu.
A estagnação reforçou ao menos três lições fundamentais. Primeiro, planejamento e gestão são imprescindíveis se não quisermos viver novas crises hídrica, hidrelétrica e outras. Segundo, um Brasil mais competitivo, rico e justo requer um Estado menor, menos oneroso à sociedade e mais eficiente. Terceiro, combater implacavelmente a corrupção é função de todo e qualquer governo e deve ocorrer em três frentes.
Para diminuir o volume de recursos acessível aos mal intencionados, precisamos reduzir o tamanho do Estado, sua participação direta na economia e os impostos. Segundo, a transparência das contas e negócios do setor público deve ser total para que a corrupção seja menor. Por fim, quando houver corrupção, as punições têm de ser draconianas.
Se o governo, as empresas e cada um de nós aproveitarmos estas oportunidades, este momento difícil da economia não terá sido perdido.
Especificamente para o setor de locação de automóveis, o que pesará neste cenário?
No lado de venda de veículos, o setor de locação de veículos tem seu resultado negativamente impactado por dois fatores. Em primeiro lugar, descontos mais significativos oferecidos pelas locadoras a compradores de veículos reduzem o diferencial de preço de compra que as locadoras normalmente disfrutam. Além disso, a demanda por veículos em queda e os menores preços dos veículos novos reduzem os valores de revenda dos usados.
Já o impacto nas locações propriamente ditas é misto. Por um lado, um cenário mais adverso, reduz o crescimento do setor de turismo e viagens em geral, impactando negativamente as locações. Por outro, as empresas, em situação de caixa mais difícil, tendem a desmobilizar suas frotas e optar por locações e, em menor grau, o mesmo fenômeno, tende a acontecer também com pessoas físicas.
A tendência é haver uma depuração do mercado? Quem sobreviverá?
Sim. O período de bonança levou muitas empresas a esquecerem seus propósitos e focarem em ganhos de curto prazo. Adeus inovações, melhoria de processos, produtos e serviços ou geração de oportunidades de crescimento para seus colaboradores.
As empresas que se perpetuam são aquelas capazes de se fortalecerem em ambientes desafiadores. Nos períodos de seca, os erros das épocas de abundância são expostos. Se corrigidos, não apenas a sobrevivência, mas o sucesso das empresas a longo prazo será garantido.
Aliás, é a própria depuração que aumentará as oportunidades para as empresas sobreviventes, que sofrerão menor competição após a depuração do mercado e terão condições de expandir sua lucratividade.
Ricardo Amorim é apresentador do Manhattan Connection da Globonews, colunista da revista IstoÉ, presidente da Ricam Consultoria, único brasileiro na lista dos melhores e mais importantes palestrantes mundiais do Speakers Corner e economista mais influente do Brasil segundo a revista Forbes internacional e uma das 100 pessoas mais influentes do Brasil segundo a Forbes Brasil.
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