Entrevista de Ricardo Amorim ao Valor Econômico sobre bolhas imobiliárias

 

Valor Econômico

10/2013

Por Roseli Loturco

 
Tido como um dos motores de qualquer economia, o ramo imobiliário no Brasil nunca esteve tão na mira de empresários e investidores nacionais e estrangeiros como nos últimos sete anos. Foi nesse período que as 14 maiores incorporadoras no país abriram capital na BM&F Bovespa a fim de levantar recursos para suportar o crescimento que viria pela frente. Algumas dessas empresas se deram bem, como a Cyrela Realty, que viu suas ações valorizarem 466,65% desde a realização do IPO (oferta inicial de ações, na sigla em inglês), em julho de 2005, até o 27/5, conforme cálculos do Valor PRO.
 
De olho nesse mercado, muitos fundos de investimentos estrangeiros se constituíram ou migraram parte de seus recursos de outros países para o Brasil. Hoje, há em torno de R$ 20 bilhões em fundos de private equity americanos, ingleses, canadenses, chineses e do Oriente Médio, disponíveis para aplicar no ramo imobiliário nacional, segundo levantamento da Ernst & Young Terco. Eles acompanham as oportunidades crescentes de ganhos e apostam em grandes empreendimentos comerciais, chamados de triplo A, nos galpões logísticos que se instalam estrategicamente próximos a grandes rodovias, além de prédios e loteamentos residências. “Tudo isso deve levar o setor a saltar dos atuais R$ 221 bilhões de receita anual para R$ 270 bilhões em até oito anos”, afirma Viktor Andrade, diretor responsável pela área de real estate e que conduziu o estudo na EYT.
 
As projeções consideraram indicadores relevantes que influenciam diretamente o setor: como o alto déficit habitacional do país, em torno de 5,6 milhões de unidades, a elevada entrada de Investimento Estrangeiro Direto (IED), que no ano passado somou US$ 4 bilhões para imóveis, a disponibilidade de crédito fácil por meio dos recursos da caderneta de poupança, que superaram os R$ 400 bilhões, e de parte do FGTS, ligada ao financiamento da habitação, próximo a R$ 350 bilhões. Além dos recursos dos fundos de private equity e imobiliários e de negociações feitas por meio dos Certificados de Recebíveis imobiliários (CRI).
 
A pesquisa também aponta para a possibilidade de altos ganhos no país e conclui que a margem bruta operacional do setor imobiliário do Brasil é uma das mais atraentes do mundo. “É o dobro das dos EUA e da China”, considera Andrade. Ou seja, é mais lucrativo construir aqui. Parte disso se explica pela alta valorização dos preços dos imóveis nos últimos anos.
 
Segundo o Knight Frank Global House Price Index, índice que monitora os preços de imóveis em 55 países, o Brasil foi onde as cifras mais subiram em 2012: 15,2%. Na sequência aparecem Hong Kong, com alta de 14,2%; Turquia, com 11,5%; e Rússia, com 10,7%. Esses indicadores levaram o Brasil a ser considerado pelo segundo ano consecutivo como o melhor mercado para investimento em imóveis entre os emergentes e o segundo a oferecer melhor oportunidade de ganho de capital, atrás apenas de EUA, de acordo com a Associação Americana de Investidores Estrangeiros em Imóveis (Afire).
 
Tudo isso faz com que muitos economistas olhem com otimismo para o setor. “Percebo nitidamente que existe um potencial enorme para o ramo imobiliário no Brasil”, afirma o professor titular do I n s p e r, Eduardo Giannetti da Fonseca, que aposta em uma década de crescimento para este ramo de atividade.
 
E se esse ritmo de alta nos preços levanta suspeitas sobre estouro de bolha imobiliária, o economista Ricardo Amorim, sócio da Ricam Consultoria, contesta. Um levantamento que fez no qual analisou as bolhas imobiliárias que ocorreram pelo mundo desde 1900, conclui o contrário. “Todas as bolhas que encontrei estouraram quando o total do crédito imobiliário superava 50% do PIB e, em alguns casos, passava de 130%. Nos EUA, em 2006,umano antes dos preços começarem a cair, era de 79% do PIB. No Brasil, apesar de todo crescimento dos últimos anos, este número é hoje de 7% do PIB. Além disso, algumas regras do sistema financeiro do país nos protegem. Não é possível hipotecar, por exemplo, mais de uma vez o mesmo imóvel por aqui, como aconteceu lá fora”, afirma Amorim.
Apesar da disparada dos preços dos imóveis no país, o professor de finanças da Fundação Getulio Vargas Fabio Gallo lembra que se comparados os valores do mercado imobiliário do Brasil a outras localidades verifica-se que os preços ainda não estão tão elevados como na Europa, Israel ou Ásia. Mas, quando a comparação é feita com os vizinhos latinos, tem-se um nível de preços elevado. “A média do metro quadrado em Londres está em US$ 21.760, em Tóquio, US$ 15.122, na China, US$ 6.931, e no Brasil, US$ 3.836, enquanto que no Chile o valor médio do metro quadrado está em US$ 1.792”, afirma Gallo, que realizou recente estudo global sobre o setor.
 
Não fosse o ano de 2012, no qual houve uma pequena retração nas vendas — que já se reverteu no primeiro quadrimestre deste ano — pode-se dizer que a última década gerou uma escalada de números generosos para todos os que resolveram aproveitar a boa onda dos imóveis no Brasil. De 2003 para cá, o volume de crédito concedido pelo sistema financeiro de habitação saltou de R$ 2,21 bilhões, com 36.480 unidades financiadas, para R$ 82,76 bilhões e 453.209 unidades. Em volume financeiro, o crescimento foi de 4.575%, segundo a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip).
 
“O setor deve crescer mais fortemente este ano, 15% ao menos. No ano passado, houve uma pequena retração nas vendas porque elas vinham crescendo em um ritmo muito forte: 40%, 65% em alguns anos. Nenhum setor suporta essa velocidade. O ideal é crescer 15%, 20% ao ano e se estruturar para isso”, afirma Octávio de Lazari Júnior, presidente da Abecip, que não acha impossível que o Brasil chegue em três anos a um total de dois milhões de unidades financiadas pelo Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE).
 
As vendas acumuladas no primeiro quadrimestre só na Região Metropolitana de São Paulo mostram que isso é possível. Foram 12.077 unidades lançadas, alta de 37,4% sobre igual período de 2012. Em março somente, foram vendidas 4.087 unidades na região, um crescimento de 83,9%, e lançados 2.845 unidades, 80,35% a mais em relação a março de 2012, de acordo com a Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio (Embraesp).
 
 

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