Economista e palestrante Ricardo Amorim ressalta oportunidades e desafios para setor varejista em entrevista à revista Supermix.

Revista Supermix
Ed. 19

Crescimento sustentado do país, aumento do crédito, mais consumidores, fortalecimento do consumo no interior. O Brasil mais preparado para crises internacionais e se beneficiando do despertar dos emergentes. Prevendo o melhor cenário da história para a próxima década, o economista e apresentador Ricardo Amorim concedeu a seguinte entrevista para a revista Supermix, na qual também fala em como o empresário do varejo está inserido neste contexto. Formado pela Universidade de São Paulo, com pós-graduação pela ESSEC de Paris, Amorim antecipou a crise elétrica brasileira de 2001, a crise imobiliária americana de 2008, a crise européia de 2010. Após oito anos em Nova York e 20 anos no mercado internacional, ele retornou ao Brasil, onde presta consultoria a clientes nacionais e internacionais.
 
DE QUE FORMA A MUDANÇA DO CENTRO DA ECONOMIA DOS EUA PARA PAÍSES EMERGENTES AFETA O BRASIL?
Nas últimas décadas, a Ásia e os países emergentes cresceram muito mais rápido do que o resto do mundo, expandindo sua importância na economia mundial. Desde a entrada da China para a Organização Mundial do Comércio em 2001, mais de dois terços do crescimento do mundo vem dos países emergentes e menos de um terço de EUA, Europa e Japão e esta tendência se intensificou após a crise de 2008. Enquanto China e Índia sustentarem um crescimento acelerado, o Brasil continuará a se beneficiar de demanda em expansão e preços em elevação de sua pauta de exportações).
 
COMO O BRASIL DEVE SE COMPORTAR EM RELAÇÃO A NOVAS POSSÍVEIS CRISES NOS EUA, EUROPA E JAPÃO?
A melhora dos fundamentos econômicos brasileiros limitará os impactos negativos de uma eventual nova recessão nos EUA, Europa e/ou Japão, a menos que eles passem por crises de proporções similares ou maiores que as de 2008, o que pode acontecer em 2011 ou 2012, devido a um provável aprofundamento da crise soberana e financeira europeia. Enquanto isso, as exportações brasileiras têm migrado para países emergentes. Em 2002, exportávamos sete vezes mais para os EUA do que para a China. Em 2010, exportamos 50% mais para a China do que para os EUA.
 
O MERCADO CONSUMIDOR BRASILEIRO MANTÉM A TENDÊNCIA DE MAIS GENTE COM PODER AQUISITIVO DE COMPRA E CRESCIMENTO DAS CLASSES A, B E C?
Aumentos reais do salário mínimo e programas de distribuição de renda continuarão a expandir o poder de compra dos consumidores e regiões mais pobres do país, impulsionando o consumo. Nos últimos cinco anos, 55 milhões de brasileiros (o equivalente a toda população da Itália) ingressaram nas classes A, B e C, ampliando exponencialmente o mercado consumidor brasileiro. Um crescimento semelhante na primeira metade desta década é provável. Desde 2004, a consolidação da estabilidade econômica permitiu uma forte e sustentada expansão do crédito, que continuará nos próximos anos, à medida que o dólar, a inflação e os juros caiam gradualmente. Por isso, os setores mais dependentes de crédito – imobiliário, automobilístico, de eletroeletrônicos e de viagens – devem continuar a ser as locomotivas do crescimento do país ao lado do setor de infraestrutura, impulsionado pelos investimentos associados à Copa do Mundo e Olimpíadas, e do setor de petróleo, devido aos investimentos do pré-sal.
 
PARA QUAIS ASPECTOS DA ECONOMIA O EMPRESÁRIO DO VAREJO PRECISA FICAR MAIS ATENTO?
Pensando nas perspectivas positivas para os próximos anos, temos aspectos muito favoráveis de crescimento geral da economia, considerando que o varejo tem um desempenho ainda superior. Temos a tendência de um maior desenvolvimento no interior do que nas capitais, em função do agronegócio, a disponibilidade de crédito e crescimento do consumo de baixa renda e da faixa que passa a poder adquirir produtos sempre aspirados. Um desafio ao setor supermercadista é competir com o destino deste crédito, voltado para aquisições no setor imobiliário e turismo, por exemplo. A cautela repousa em dois processos de desaceleração: a alta da inflação, que limita a renda e reduz o consumo, e a piora da crise européia, afetando o
país. É preciso se preparar para este cenário, sendo que varejo deve ter um crescimento de 6% e 7%.
 
O QUE SOBRA E O QUE FALTA AO EMPRESÁRIO BRASILEIRO ATUALMENTE?
O que falta: acreditar que o país está em um processo de sustentabilidade de crescimento. O empresário brasileiro está treinado para o Brasil que não dá certo e isto não condiz mais com a realidade atual. Também falta uma atuação mais forte junto ao governo, mobilizando ações pela melhoria de infraestrutura, redução de tributos, condições de educação para mão-de-obra. O que sobra: o empresário no Brasil desenvolveu uma capacidade de ajuste, de lidar com o imprevisto, de ser flexível a mudanças.
 
COMO O EMPRESÁRIO DO VAREJO PRECISA ENCARAR A MÃO-DE-OBRA PARA O SETOR E SUSTENTABILIDADE?
Se antes, havia falta de emprego e o empresário colocava as regras, hoje este cenário não existe mais. O varejo compete em mão-de-obra com outros setores, como o de construção civil, por exemplo, em crescimento e muito competitivo em relação a salários. Sendo assim, é preciso ter estratégias de formar, preparar e manter funcionários. Já a sustentabilidade é um grande desafio que vem por aí.
Temos mais gente consumindo, temos mais gente poluindo também. Somente no Brasil são 55 milhões de pessoas que subiram de classe social. Na Índia foram 200 milhões e na China 400 milhões. Globalmente, estamos usando mais recursos naturais e precisaremos agir. Como uma forma de pressão, consumidores alemães passaram a deixar, nas lojas e supermercados, embalagens de produtos que não precisavam acompanhá-los até em casa e ir para o lixo. Até que elas não estivessem mais lá. É isto: o setor vai vender mais, mas vai precisar vender diferente.

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