06/2015
Por Ricardo Amorim
Mudanças ocorrem de várias formas. Adaptar-se a elas é essencial. Na economia, não é diferente. Considerando dados do Banco Mundial, neste milênio, países emergentes cresceram e contribuíram para o crescimento global quase três vezes mais do que países ricos. Chocante, não? Nunca antes na história deste planeta isso tinha acontecido. Por quê? Calma! Está tudo explicadinho aqui embaixo.
Talvez você não se lembre, afinal, já faz 15 anos que esta história começou. O Brasil ainda não era o país do surf, George W. Bush era o presidente dos Estados Unidos e o grande lançamento que gerava burburinho não era o iPhone, nem o iPad, mas o iPod, lançado só dois meses antes. No entanto, a entrada da China na Organização Mundial do Comércio, em dezembro de 2001, mudou a ordem econômica global e mudou-a a favor dos mercados emergentes. O mundo virou de cabeça para baixo e nossa pátria e todo o resto do mundo emergente passaram a planar nos ventos que começaram a soprar lá do Oriente.
Separamos abaixo as consequências da entrada da China na OMC e seus impactos gerais:
Bom, mas e aí, o que tem muito na China? A pergunta não é difícil e nos ajuda a entender o cenário. Sim, isso mesmo, muito chinês! Para economistas, como eu, isto significa muitos braços para trabalhar e bocas para alimentar. Os chineses são muitos, são pobres e a saída de centenas de milhões deles do campo para a cidade nos últimos 10 anos fez com que aumentasse a demanda por alimento e por matérias-primas, como por exemplo, ferro, aço e cimento. O Brasil é um dos maiores exportadores mundiais de todos estes produtos.
Aumento da procura por Matérias-Primas
Nações e continentes exportadores de matérias-primas como o Brasil, a América Latina e a África passaram a vender mais caro o que fazem e exportam. O agronegócio brasileiro, por exemplo, que tinha um superávit comercial na faixa de dez bilhões de dólares nas duas décadas anteriores, alcançou, impulsionado pela entrada da China na OMC, um superávit comercial de noventa e três bilhões de dólares!
O mundo é inundado de produtos manufaturados
O estágio do processo de urbanização na China, com ainda 50% da população vivendo em áreas rurais, é o mesmo em que o Brasil estava no início nos anos 50. Os 400 milhões de chineses que saíram do campo para as áreas urbanas na última década, deixando para trás a agricultura de subsistência e expandindo a produção da indústria chinesa, adicionaram ao comércio mundial uma quantidade colossal de produtos manufaturados, barateados pelo baixo custo da mão de obra chinesa. Isto favoreceu países que importam estes produtos mais do que os exportam e hoje pagam muito menos por eles, como mais uma vez é o caso do Brasil, América Latina e África.
O mundo é inundado de dinheiro barato
Por quê? Como vimos antes, os chineses encheram o mundo de produtos baratos. Com isso, a inflação mundial caiu, o que permitiu que os juros caíssem também em todo o mundo. Para completar, a crise financeira global, juntamente com as dificuldades econômicas nos países ricos desde então, levou-os a reduzir ainda mais as taxas de juros, a ponto de a taxa média de juros básicos nos países desenvolvidos ser hoje de apenas 0,1% a.a. Vários destes países têm taxas de juros negativas. Isto mesmo, hoje, na Suíça, Dinamarca, Suécia, Alemanha, Finlândia, França, Bélgica, Holanda, Áustria e Japão, paga-se a quem tomar dinheiro emprestado para tentar incentivar empresas a investir e pessoas a consumirem para impulsionar a economia.
Esse movimento foi muito bom para países que precisavam atrair capital externo para financiar consumo e investimento. Ou seja, estamos falando de quem? De países emergentes. Olha o Brasil aí!
Nos últimos quinze anos, os fatores citados acima levaram à queda do crescimento médio dos países ricos. Na média, cresceram 1,7% aa, o que, na prática, é pouco mais do que a metade da taxa média de crescimento que eles tinham sustentado nos 30 anos anteriores. Já nos países emergentes, a taxa média de crescimento dobrou.
A sequência é simples, mais crédito, consumo e crescimento em países emergentes. Não é por acaso que o Brasil cresceu entre 2004 e 2010, muito mais do que em qualquer outro período após a redemocratização no final dos anos 80.
Apesar de toda a discussão atual sobre crise na China, o país continua a ser a segunda grande economia que mais cresce no mundo, superado apenas pela Índia – que, aliás, lá pelo final desta década ou início da próxima, começará a causar uma nova rodada de impactos na economia global, similares aos causados pela China desde 2001 e que também deve durar cerca de duas décadas.
De qualquer forma, por conta da desaceleração recente da economia chinesa, o crescimento nos países emergentes e no mundo desacelerou-se um pouco, mas continuou a ser o mais rápido que qualquer outro período da história do planeta, com exceção do período entre 2002 e 2010. Já no Brasil, por razões particulares, as coisas mudaram bastante e não foram para melhor (e nem estamos falando do 7×1!). Para o Brasil voltar a aproveitar os fatores que impulsionaram nosso crescimento até 2010 e continuam a impulsionar o da grande maioria dos outros países emergentes e voltar a crescer como na década passada, basta colocarmos a casa em ordem, ajustando as contas públicas, controlando a inflação e tomando medidas que estimulem a competitividade e a produtividade no país, mas isso foi assunto de outro post.
Ricardo Amorim é apresentador do Manhattan Connection da Globonews, presidente da Ricam Consultoria, o brasileiro mais influente no LinkedIn, único brasileiro na lista dos melhores e mais importantes palestrantes mundiais do Speakers Corner e o economista mais influente do Brasil segundo a revista Forbes.