Entrevista do economista e palestrante Ricardo sobre transformações da economia mundial e impactos no cooperativismo.

SICOOB – COCECRER
12/2011

 
Entrevista – Ricardo Amorim
 
Informativo Cocecrer: Como as transformações recentes na economia mundial afetam o Brasil?
Ricardo Amorim: Várias transformações, que basicamente colocaram o Brasil na rota de crescimento sustentado, nos ajudam de uma década para cá e devem continuar por algum tempo. As quatro mais importantes são: a elevação no preço de matérias-primas, que são produtos que o Brasil produz e exporta. Isso acaba fazendo com que nós vendamos mais caro e, portanto, tenhamos receitas maiores. A segunda é que, ao mesmo tempo, o preço de vários produtos industrializados, em particular eletroeletrônicos, está caindo. O resultado é que o Brasil está vendendo mais caro comprando mais barato, ou seja, se beneficiando duas vezes. A terceira: nós hoje estamos trazendo dinheiro para o Brasil mais barato, em função do movimento de queda de inflação no mundo e, por consequência, na queda de juros mundiais. Para o Brasil, que precisava atrair crédito externo para financiar tanto consumo como investimento, isso é ótimo. O último ponto que nos ajuda é que em função dos três primeiros e do crescimento do país, a gente passa a atrair talentos para o Brasil nas mais diferentes áreas.
 
Tudo isso faz com que o Brasil cresça mais, ou seja, uma série de forças impulsionado o crescimento brasileiro. Consequência disso foi que nos últimos oito anos o nosso crescimento foi o dobro da média dos 25 anteriores, o que acelerou muito o crescimento brasileiro e vai continuar acelerado. Só que no meio do caminho, como dizia Drummond, há algumas pedras. E uma está logo na nossa cara, que é o agravamento da crise europeia, o que pode vir a causar – e provavelmente causará – algo parecido com que aconteceu em 2008, quando bancos do Estados Unidos e Europa perderam muito dinheiro e cortaram linhas de crédito para o Brasil. Isso temporariamente faz com que empresas e bancos brasileiros tenham menos acesso ao crédito externo, o que acaba impactando negativamente nossa economia.
 
Em segundo lugar, nossas exportações, no auge dessa crise externa, também são negativamente impactadas. O preço das commodities cai e isso também tem um impacto negativo no Brasil. É mais ou menos o que eu acredito que vai acontecer.
Mais especificamente para o cooperativismo de crédito, que é um ponto importante, a última crise foi uma oportunidade e eu acredito que essa será de novo. As linhas bancárias tradicionais, que são os bancos tanto públicos quanto privados não cooperativos, acabam escasseando e, a medida que esses
bancos têm menos acesso a financiamentos, eles acabam oferecendo menos ou créditos mais caros. E aí o espaço para ser ocupado pelo cooperativismo de crédito cresce.
 
IC: Você acredita que o cooperativismo de crédito pode ser uma opção para o Brasil e também para os países em crise?
RA: Na realidade o cooperativismo de crédito é mais um dos instrumentos para se construir um setor creditício sólido e forte.
Se por um lado seria ilusão acreditar que podemos construir um modelo de crédito único, exclusivamente baseado nele, é também uma ilusão muito grande achar ou não utilizá-lo como um dos alicerces. No Brasil, em relação a outros países, a participação do cooperativismo de crédito ainda é muito pequena. O exemplo mais marcante, aonde há uma participação bastante significativa, é a Alemanha. Aqui ainda existe um espaço significativo de crescimento para o setor, tanto do crédito quanto da participação do cooperativismo nesse total.
 
IC: E o que precisa ser implementado para esse crescimento?
RA: Em primeiro lugar precisamos entender que o crédito no Brasil, de uma forma geral, é pequeno e limitado pelo nosso histórico de país muito instável, onde ninguém conseguia assumir dívida porque não saberia qual seria a situação dali dois ou três anos. Essa realidade mudou, mas a mentalidade do brasileiro ainda não totalmente.
 
Fomos criados em um país que dava errado e vivia uma crise atrás da outra, por conta disso o brasileiro hoje planeja muito menos que em outros lugares, e a consequência é a limitação exatamente na utilização e expansão do crédito. Só que isso já começou e vai continuar a mudar. Outro
aspecto é que é de interesse do próprio regulador do setor de crédito no Brasil, mais especificamente o Banco Central, que tenha um setor de cooperativismo de crédito mais forte para aumentar a competição como forma de baratear o crédito, que é extremamente caro por uma série de razões, as mais importantes: impostos elevadíssimos e depósitos compulsórios bancários também elevados. E mais uma vez, como um dos alicerces desse modelo, o cooperativismo de crédito pode cooperar de forma importante.
 
IC: Você afirma que o Brasil é hoje a “terra das oportunidades”. Como o pequeno empreendedor, seja lá da cidade ou do campo, pode transformar essas oportunidades em resultados?
RA: Olhando para os próximos meses, eu teria uma preocupação grande que é a de não alavancar mais a operação. Em outras palavras, estamos numa hora de sermos conservadores e termos uma expansão, eu diria, cuidadosa, lenta e muito criteriosa.
 
Isso porque é provável que a situação na Europa piore, com impacto nos bancos, e consequentemente uma restrição para o setor de crédito não cooperativo no Brasil. Isso vai gerar oportunidades ao longo do ano que vem, talvez ao longo de 2013, de um crescimento mais forte no setor de cooperativismo de crédito, como aconteceu há alguns anos em função da última crise.

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