Entrevista de Ricardo Amorim sobre perspectivas para a economia e o mercado imobiliário no Rio de Janeiro

06/2014

ADEMI-Rio

Palavra de quem entende
 
ADEMI Rio ouve especialistas para desvendar a enxurrada de índices, previsões e análises contraditórias sobre o desempenho da economia nacional.
 
Informação é moeda de troca importante em qualquer atividade econômica. Mas nem sempre é fácil absorver e analisar o que está por trás de índices e projeções muitas vezes contraditórios. Nos últimos tempos, observa-se uma gangorra de humores nas análises sobre o mercado brasileiro, do céu ao inferno sem escalas.
Em tempos de Copa do Mundo, a ADEMI Rio decidiu escalar um trio de peso para opinar sobre o atual momento da economia brasileira. Seguidores de diferentes escolas e com bagagens e opiniões também diversas, Luiz Carlos Bresser-Pereira, Sérgio Besserman e Ricardo Amorim discorrem sobre questões que estão diariamente nas manchetes dos principais jornais. As opiniões formam um mosaico da atualidade, dos desafios erros e acertos.
 
O crescimento da economia brasileira em 2013 – 2,3%
“Para um país emergente, como o Brasil, ficar próximo à média mundial é muito pouco. Infelizmente, desde 2011 temos crescido menos do que a média dos países emergentes. Nos últimos anos, o crescimento brasileiro se baseou na classe média e em seu potencial de consumo. A expansão do consumo de massas em si é muito benéfica em termos econômicos e sociais. O problema é que não pode ser a única base de crescimento do país. Se um país só estimula o consumo e não investe na produção, acaba gerando um desequilíbrio entre forte crescimento da procura por produtos e serviços e crescimento menor da oferta desses produtos e serviços. O resultado é menor crescimento econômico, pressão inflacionária e piora
da balança comercial devido ao grande aumento das importações.”
 
Interpretações díspares
“De fato, uma quantidade enorme de informações econômicas é divulgada diariamente. O importante é separar o joio do trigo e saber quais informações são importantes e quais não são. Reconheço que não se trata de uma tarefa fácil, mesmo para especialistas. Dois fatores que ajudaram no crescimento acelerado de 2004 a 2010 acabaram: incorporação de mão de obra ao mercado de trabalho e maior utilização da infraestrutura existente. Para sustentarmos um crescimento mais rápido, só investindo muito em qualificação de mão de obra, máquinas, equipamentos e infraestrutura. Não há milagres. A China, que cresce a uma velocidade três a quatro vezes maior do que o Brasil, investe em sua infraestrutura, a cada ano, o equivalente a todo o estoque de infraestrutura existente por aqui. A única forma de voltarmos a crescer mais é aumentando muito os investimentos produtivos no país, começando pelos investimentos em infraestrutura e intensificando a produtividade dos trabalhadores brasileiros. É preciso investir em educação, treinamento e inovação.”
 
Política cambial
“Infelizmente, nos últimos anos, todas as fichas foram apostadas na desvalorização do real. Como se isso, por si só, fosse capaz de resolver todos os problemas de competitividade. Percebe-se, agora, que a estratégia falhou. O governo promoveu uma forte desvalorização da taxa de câmbio no ano passado. Os resultados? A produção industrial caiu 2,7% em 2012 e, com o encarecimento dos produtos importados, a inflação de janeiro de 2013 foi a mais alta desde 2005.”
 
Desempenho da indústria
“Nos últimos dez anos, a produção da indústria no Brasil cresceu em oito e caiu em dois, 2009 e 2012, os únicos anos em que a taxa de câmbio média se desvalorizou. Se o problema é a cotação do real, por que a indústria sofre exatamente quando o problema diminui? Porque a valorização do câmbio – ainda que efetivamente aumente os desafios para a indústria – não é a causa original de suas dificuldades, mas sim consequência dos mesmos processos globais que têm causado tais dificuldades. A primeira, provocada pela migração da indústria global para a China, em função de custos de mão de obra menores, começou após a entrada do país asiático na Organização Mundial do Comércio, em 2001. Desde então, a produção da indústria chinesa triplicou, a brasileira cresceu menos de 30%, ainda assim, um ótimo resultado quando comparado à indústria dos países ricos, que encolheu. A segunda é a própria crise econômica dos países desenvolvidos desde 2008. Com a expansão do crédito e da renda no Brasil, as vendas do varejo cresceram mais do que a produção da nossa indústria em todos os anos desde 2004. Da mesma forma, a queda da renda e do crédito nos países desenvolvidos desacelerou as vendas internas. Isso gerou capacidade ociosa e forçou a indústria deles a redirecionar uma parte crescente da produção para os países onde o consumo está crescendo, os emergentes, incluindo o Brasil. Oferecendo isenções tributárias temporárias a alguns subsetores industriais e medidas protecionistas a outros, o governo divide e cala nossos industriais, mas não elimina gargalos estruturais. Em alguns casos, até os agrava. Encarecer a importação de componentes, por exemplo, além de aumentar o preço para os consumidores, piora a situação dos subsetores que os utilizam.”
 
Mercado imobiliário
“Os preços dos imóveis, dependendo de localização e características, subiram entre 150% e 1.000%. Portanto, teriam de cair entre 60% e 90% – o que é altamente improvável – apenas para voltar aos preços de 2007. Quem ouviu a previsão das “Cassandras” está esperando até hoje os preços caírem. Precisar quando uma bolha imobiliária vai estourar é impossível, mas bolhas não estouram antes de estarem suficientemente cheias, o que torna possível termos uma ideia aproximada se estamos perto ou distante do estouro. Em um de meus artigos, publicado há um ano, assim como em todos os anteriores, concluí que não havia sinais de bolha e que os preços continuariam a subir. De lá para cá, de acordo com o índice FipeZap, na média, o preço dos imóveis subiu 13,5% no Brasil. Para analisar o atual ritmo de construção no Brasil, uso o nível de consumo anual per capita de cimento, que estimo estar em 350kg. Até hoje, nenhuma bolha imobiliária estourou com menos de 400kg per capita anual de consumo de cimento.”
 
Competitividade do mercado
“Os entraves são inúmeros, mas na essência, quase todos são decorrentes do fato de que pagamos um dos governos mais caros do mundo, mas recebemos um dos mais ineficientes. Em dois países emergentes a carga tributária é maior do que aqui; em outros 153 países, ela é menor. Dos mais de R$ 5 trilhões em riqueza que o país vai gerar este ano, quase R$ 2 trilhões serão desviados das famílias – onde poderiam alimentar o consumo – e das empresas – onde poderiam virar investimento – para o setor público, por meio de impostos, taxas e contribuições.”
 
Rio de Janeiro
“Como tudo na vida, o copo da economia do município do Rio de Janeiro está meio cheio e meio vazio. No lado cheio aparecem os grandes investimentos dos últimos anos nos setores de petróleo e gás, turismo e educação, universitária privada, combate mais duro à criminalidade
com a pacificação de favelas, e a tentativa, ainda embrionária, de se formar um polo de tecnologia, como parte do projeto de revitalização da Zona Portuária. Como parte do copo vazio, eu cito a incapacidade do município, até aqui, em encontrar sua nova vocação desde que a capital federal se mudou para Brasília.”
 
Rating
“As agências de rating não passam de um espelho que mostra a situação do país. Se você olhar para um espelho e perceber que o lugar em que você se encontra está pegando fogo, provavelmente, sairá correndo de lá. Se muita gente fizer isso ao mesmo tempo, podemos ter uma situação de pânico. Mas não dá para culpar o espelho pelo pânico.”
 
Brics, céu ou inferno?
“Acho que neste momento a maior parte do mundo está mais preocupada com a Rússia do que com o Brasil, mesmo que por razões políticas. Do ponto de vista econômico, infelizmente, o Brasil é o país com pior desempenho entre os Brics.”
 
O que espera de 2014
“Gostaria de ver uma mudança no modelo de desenvolvimento brasileiro com mais estímulos à produção, e não apenas ao consumo, como tem acontecido nos últimos anos. Para que tais estímulos pudessem ter a magnitude necessária, o governo teria de cortar seus gastos, liberando recursos para poder investir mais em infraestrutura e reduzir impostos, o que dificilmente ocorrerá.”
 
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