A crise brasileira ainda deve piorar. Bom para você.

08/2015

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Por Ricardo Amorim

 

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Desde a crise financeira global de 2008, a economia brasileira foi sendo fragilizada por medidas preocupadas só com o curto prazo. Como um alcoólatra, o governo brasileiro respondia a qualquer contratempo com uns bons goles. Nossa doença foi se agravando. Na gestão de Guido Mantega como Ministro da Fazenda, a balança comercial de produtos manufaturados foi de um superávit de US$5 bilhões a um déficit de US$110 bilhões, a inflação saiu de controle, as contas públicas apresentaram déficits recordes e o crescimento econômico vem minguando desde 2011.

 

Neste ano, passadas as eleições e sob pena de colapso do doente, chegou a hora do tratamento de choque. Para ajustar as contas públicas, reduções de gastos públicos seriam a solução ideal. Na falta delas, aumentos de impostos tornaram-se inevitáveis. Para segurar a inflação impulsionada pela recomposição das tarifas públicas artificialmente contidas até as eleições, a taxa de juros dobrou, encarecendo o crédito e limitando as compras dos consumidores e a remarcação de preços das empresas.

 

Os efeitos da crise de abstinência vieram com força. O PIB despencou e a taxa de desemprego não para de aumentar.

 

A abstinência, se sustentada, controla o alcoolismo, mas os esforços para sustentá-la são hercúleos. No caso da economia brasileira, os esforços talvez sejam ainda maiores.

 

Em paralelo à crise econômica, a crise política come solta com o avanço das investigações da Operação Lava Jato e do TCU. O número e o patente dos políticos investigados não para de subir.

 

O script seguido pela Polícia Federal parece uma versão tropical da Operação Mãos Limpas, que desmantelou a máfia na Itália. Primeiro ato: comece a investigação focando em agentes privados, menos acostumados a serem investigados do que os políticos e com menos conexões para  tentar bloquear a investigação. Segundo ato: alimente a mídia de novidades constantemente para garantir que o assunto não esfrie e a opinião pública, chocada, exija que as investigações continuem. Terceiro ato: julgue e prenda alguns dos culpados rapidamente, assustando outros investigados e os estimulando a cooperar com as investigações através de delações premiadas. Ato final: investigue os políticos e os leve a julgamento.

 

Há poucas semanas, entramos no início do ato final e o medo aumentou em Brasília, acirrando as disputas políticas e elevando as tensões entre o Executivo e o Judiciário. Com isso, a aprovação de medidas fundamentais ao ajuste fiscal pelo Congresso tornou-se inviável e o governo abandonou a promessa de abstinência e anunciou a redução da meta fiscal. Com a meta fiscal foi-se parte dos resultados dos sacrifícios desde o início deste ano para recuperar a credibilidade da economia brasileira. Mais que depressa, a agência de classificação de risco Standard & Poor´s adotou um viés negativo para a classificação brasileira. Se o viés for confirmado, o Brasil será jogado de volta ao clube dos maus pagadores, de onde saímos em 2008, após anos de esforços. As consequências foram as esperadas: os juros e o dólar subiram ainda mais e as ações caíram. Juntos com elas, projetos de investimentos no país foram por água abaixo. Com menos investimentos, teremos menos empregos. A crise econômica será mais longa e profunda. A recuperação econômica, que poderia começar na segunda metade deste ano, foi adiada para o ano que vem.

 

O processo de retroalimentação das crises política e econômica não parece já ter terminado. O avanço das investigações sobre o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha; o presidente do Senado, Renan Calheiros e o ex-presidente da República, Lula da Silva, jogará mais lenha na fogueira, aumentando o risco de que a presidente Dilma Rousseff – que já tem os mais baixos níveis de aprovação e apoio no Congresso de qualquer presidente nos últimos 30 anos – não chegue ao fim do seu mandato, em função de impeachment ou renúncia.

 

Tanta incerteza política contaminará a economia, que provavelmente ainda piorará mais antes de começar a melhorar.

 

E como, afinal, este quadro de caos pode ser bom para você? De várias formas.

 
Em primeiro lugar, o fosso econômico é inegavelmente profundo, mas ao menos devemos parar de cavá-lo até o final deste ano ou início do ano que vem, após a queda da inflação e o pico da crise política, o que em relação ao nosso passado recente não deixa de ser uma boa notícia considerando-se que o estamos cavando há pelo menos 5 anos.
 

Segundo, a crise política e as investigações sobre corrupção impactam negativamente a economia, mas se levarem à efetiva condenação dos culpados, podem reverter a cultura de impunidade reinante no país há tempos. Com o Supremo Tribunal Federal aparelhado politicamente, isto está longe de estar garantido, mas se a pressão popular ferver nas ruas na época dos julgamentos, como provavelmente acontecerá, será que os juízes ousariam terminar tudo em pizza? Se os poderosos forem condenados de forma exemplar, todos os outros brasileiros, bem menos poderosos, pensarão duas vezes sobre os riscos antes de praticarem atos ilícitos e os impactos positivos sobre a forma de se fazer negócios no Brasil serão enormes.

 

Terceiro, quando a economia está ajudando, até profissionais menos competentes e empresas menos eficientes conseguem sair-se relativamente bem. No deserto das crises, as diferenças de desempenho entre os melhores e os demais ficam mais gritantes, gerando oportunidades para profissionais e empresas capazes de tomarem decisões duras ou ousadas, que muitas vezes são postergadas em momentos de calmaria. No auge da crise 1929, por exemplo, a IBM investiu 6% do seu faturamento em um centro de pesquisas que acabou tornando-a, a única empresa capaz de processar os dados de 28 milhões de beneficiários do seguro social americano, criado em 1935 em resposta aos efeitos perversos da própria crise econômica. As empresas e os profissionais mais competentes costumam sair fortalecidos das crises. O desafio, mas também a oportunidade é usar a crise como um estilingue para catapultar-nos a um nível de eficiência maior. Sem a pressão da crise, talvez nunca fizéssemos isso. As melhores empresas e melhores profissionais nunca desperdiçam uma crise.

 

Quarto, há empresas, linhas de negócios e produtos que só nascem ou prosperam em função de crises econômicas. O Idealab, da Califórnia, que já lançou mais de 125 novas empresas, realizou uma pesquisa sobre as razões do sucesso destas e outras novas empresas e, para própria surpresa, descobriu que a razão mais importante para o sucesso ou fracasso de uma startup não é a ideia, a equipe, seu modelo de negócio ou sua forma de financiamento, mas quando a empresa é lançada. Mais surpreendente, muitas empresas só tiveram sucesso porque foram lançadas em crises econômicas. Os dois casos recentes mais marcantes são o Airbnb – uma empresa de reservas de acomodações em casas e apartamentos lançada em novembro de 2008, hoje presente em mais de 35.000 cidades e 192 países – e o Uber – uma empresa de caronas remuneradas criada em março de 2009. As ideias das duas empresas foram, inicialmente, recebidas com muito ceticismo por investidores que alegavam que ninguém aceitaria estranhos em seu carro ou casa e que, por consequência, as empresas não teriam viabilidade econômica. A crise imobiliária e financeira nos EUA e Europa mudou esta realidade. Com a alta do desemprego, muitos viram nos serviços da empresa a alternativa para aumentarem suas fontes de renda, o que permitiu que as empresas conseguissem atrair negócios e financiamento e crescessem. Com 6 anos de vida, o Airbnb vale hoje R$88 bilhões e o Uber vale R$176 bilhões. Com mais de 60 anos de existência, a Petrobras vale R$137 bilhões.

 

Quer conhecer mais casos de empresas grandes e pequenas que estão prosperando apesar ou por causa da crise ou contar o caso da sua empresa? Foi para isso que criei no começo do ano a página #TemJeitoSim. Confira, siga e deixe o seu depoimento.

 

Ricardo Amorim é apresentador do Manhattan Connection da Globonews, presidente da Ricam Consultoria, único brasileiro na lista dos melhores e mais importantes palestrantes mundiais do Speakers Corner, economista mais influente do Brasil segundo a revista Forbes e uma das 100 pessoas mais influentes do Brasil segundo a Forbes Brasil.

 
 

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