Entrevista do economista Ricardo Amorim sobre os desafios para o Brasil acelerar seu crescimento

06/2014

Abradilan

 
1. Como foi o desempenho da economia brasileira neste primeiro semestre?
Decepcionante. Nos últimos anos, o crescimento brasileiro baseou-se no crescimento da classe média e seu potencial de consumo. A expansão do consumo de massas em si é muito benéfica em termos econômicos e sociais. O problema é que ela não pode ser a única base de crescimento do país e tem sido. Se um país só estimula o consumo e não estimula a produção, acaba acontecendo um desequilíbrio entre forte crescimento da procura por produtos e serviços e crescimento menor da oferta destes produtos e serviços. O resultado é menor crescimento econômico, pressão inflacionária e piora da balança comercial devido a forte aumento das importações. Foi exatamente o que aconteceu no Brasil.
 
2. Diante desse quadro temerário, quais são as previsões para o Brasil no segundo semestre?
Infelizmente, ruins. Em novembro do ano passado, escrevi um artigo chamado Feliz 2014? Prevendo que a economia brasileira como um todo teria, na melhor das hipóteses, um 2014 medíocre. . Na pior, estagnação. Sem uma nova crise externa, o PIB deve cresceria cerca de 2% e os juros subiriam para impedir que a inflação aumentasse, mas se uma desaceleração dos estímulos monetários nos EUA deflagrasse o estouro de bolhas de ativos pelo mundo, a recuperação da economia chinesa fosse abortada ou novas crises financeiras pipocassem na Europa ou nos países emergentes, nosso crescimento seria próximo de nulo. De lá para cá, as perspectivas para o crescimento brasileiro pioraram.
Aliás, todo final de ano, escrevo um artigo sobre as perspectivas econômicas para o ano seguinte. Feliz 2014? Foi o 4º artigo consecutivo prevendo que o crescimento no Brasil decepcionaria. Enquanto nossa política econômica não mudar, privilegiando a produção, o crescimento não vai se acelerar de forma sustentável.
 
3. Como o senhor analisa o câmbio?
Está muito difícil de saber o que acontecerá com o câmbio. Em primeiro lugar porque o governo apostou suas fichas nos últimos anos em que a desvalorização do real sozinha resolveria nossos problemas de competitividade, mas a estratégia não funcionou. Aliás, não era necessário ser nenhum gênio para saber que ela não funcionaria. Eu mesmo publiquei vários artigos ao longo dos últimos três anos prevendo que isto aconteceria. No último deles, Industriais do Brasil, uni-vos!, publicado há um ano, reafirmei, como já havia explicado no artigo Diagnóstico Errado que é equivocada a idéia de que as dificuldades da indústria brasileira vem de um real excessivamente valorizado. Baseado nesse diagnóstico errôneo, o governo promoveu uma forte desvalorização da taxa de câmbio no ano passado. Os resultados? A produção industrial caiu 2,7% em 2012, e cresceu muito pouco em 2013 e no início deste ano e a inflação se acelerou.
Com isso, mais recentemente ele tem preferido políticas de estímulo setorial.
Por outro lado, há atualmente, nos mercados internacionais, dois importantes riscos altistas para o dólar ao longo dos próximos 18 meses: um eventual estouro da bolha imobiliária e de crédito na China ou da bolha acionária nos EUA. Nos dois casos, a alta do dólar seria bastante grande.
 
4. Com tantas questões econômicas pairando, como não perder o foco no que é importante, a baixa inflação?
Para limitar a deterioração da balança comercial e tentar proteger nossa indústria dos importados, o governo desvalorizou o real, aumentou impostos sobre produtos estrangeiros, compras no exterior e em sites de importados. Isso permitiu que a indústria nacional elevasse preços e recompusesse suas margens. Às altas de preços dos produtos industrializados somaram-se fortes elevações dos preços dos serviços, mantendo a inflação sistematicamente acima da meta de 4,5% ao ano desde 2009.
A inflação não está apenas mais elevada, está grávida. O dragãozinho dos preços controlados pelo governo nasce após as eleições. Há mais de um ano, os preços de ônibus, metrô, gasolina, energia elétrica e outros têm sido represados para conter a inflação e as manifestações de rua. Estes preços terão de ser realinhados para evitar o colapso dos serviços e contas públicas.
Só a diferença entre o preço internacional do petróleo e os preços nacionais de seus derivados custa à Petrobrás mais de R$ 40 bilhões anuais. A utilização de usinas termoelétricas para geração de energia elétrica custará de R$ 20 bilhões a R$ 30 bilhões só neste ano, e mais ainda em 2015. A renúncia fiscal com a desoneração de salários custará mais R$ 24 bilhões só em 2014. O ajuste das contas públicas é inevitável. Ele virá através de elevação de preços, corte de gastos do governo ou aumento de impostos, provavelmente os três.
Os reajustes pressionarão a inflação, forçando o Banco Central a aumentar ainda mais os juros, que já estão no nível mais alto desde 2011, limitando o crédito e reduzindo o crescimento econômico. Aumentos de impostos e redução de gastos do governo devem retirar dinheiro da economia em 2015, também limitando o crescimento.
 
5. O que realmente está acontecendo com a economia Brasileira nos últimos anos?
Dois fatores que permitiram que o Brasil avançasse 2,5 vezes mais rápido entre 2004 e 2010 do que antes se esgotaram: incorporação de mão de obra e maior utilização da infraestrutura já existente. Desde 2003,quase 20 milhões de brasileiros sem emprego passaram a trabalhar, colaborando com a produção. O desemprego caiu de 12% para 5%. Não cairá muito mais. Aliás, o total de empregos nas principais capitais é que já vem caindo.
Quanto à infraestrutura, dificuldades financeiras e operacionais no setor público e problemas regulatórios impediram um crescimento dos investimentos na magnitude necessária, criando um apertado gargalo para o desenvolvimento.
Só poderíamos crescer como antes acelerando a produtividade, o que exigiria trabalhadores melhor preparados e equipados. Como não investimos o bastante em educação e treinamento, nem em máquinas, equipamentos e tecnologia, a taxa média anual de expansão do PIB desde 2011 caiu para apenas 2%,
 
6. Quais são as perspectivas macroeconômicas para o Brasil em 2014?
O crescimento em 2014 continuará no ritmo lento dos últimos anos. Pior, há razões para crer que o crescimento vá desacelerar em 2015.
Não apenas crescemos pouco, mas bagunçamos a casa. Piorou o desempenho das contas externas e das contas públicas e a inflação subiu. Cedo ou tarde, estes desequilíbrios terão de ser corrigidos. Enquanto os ajustes forem feitos, provavelmente em 2015, nossa economia crescerá ainda menos
 
7. Como a Copa do Mundo afetou o Brasil, economicamente falando?
Infelizmente, o Brasil terá todos os ônus geralmente associados a sediar uma Copa, mas não todos os bônus. Por falta de planejamento, os investimentos em infraestrutura ficaram muito aquém do que se esperava. Além disso, os impactos positivos em turismo e comércio exterior durante e depois da Copa devem ser menores do que os usuais em função de preocupações com a segurança e as manifestações.
 
8. O senhor acredita que os investimentos em infraestrutura ficarão limitados aos feitos para os eventos esportivos?
Não. Acredito que estes investimentos crescerão a partir do ano que vem, após as eleições, quando o apetite do setor privado em participar de Parcerias Público-Privadas (PPPs) deve voltar a crescer.
 
9. Em que medida essas manifestações que vem ocorrendo podem afetar a economia do país?
Elas já reduziram nossa capacidade de atração de turistas estrangeiros e, nos momentos mais tensos impactam negativamente a atividade do comércio em geral. Para completar, elas assustam empresários e acabam reduzindo os investimentos.
 
10. O Brasil está com status de país de futuro, principalmente no exterior. O senhor acredita nesse cenário? Já chegamos a esse patamar?
O Brasil e visto como o país do futuro há muito tempo. Cabe  a nós transformar este potencial em realidade.
 
11. Quais são os fatores necessários para que a indústria brasileira recupere sua competitividade?
Para retomarmos a competividade, e sustentarmos um crescimento mais rápido, só investindo muito em qualificação de mão de obra, máquinas, equipamentos e infraestrutura. A China, que cresce 3 a 4 vezes mais rápido que o Brasil, investe em sua infraestrutura, a cada ano, o equivalente a todo o estoque de infraestrutura existente no Brasil.
A única forma de voltarmos a crescer mais e aumentando muito os investimentos produtivos no país, começando pelos investimentos em infraestrutura e aumentando a produtividade dos trabalhadores brasileiros, investindo em educação, treinamento e inovação.
 
12. Como as eleições devem afetar a economia este ano?
A incerteza que elas trazem acabam causando adiamento de decisões de investimento. Por isso, elas acabam tendo um impacto negativo sobre o desempenho da economia neste ano.
 
13. Quais os fatores fundamentais para fazer a economia crescer?
Aumentar a produtividade e a competitividade brasileira, o que requer desburocratizar o país e fazer importantes reformas estruturais, particularmente a tributária e a trabalhista.
 
 
Ricardo Amorim é apresentador do Manhattan Connection da Globonews, colunista da revista IstoÉ, presidente da Ricam Consultoria, único brasileiro na lista dos melhores e mais importantes palestrantes mundiais do Speakers Corner e economista mais influente do Brasil segundo o Klout.com.Perfil no Twitter: @ricamconsult.
 

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