Entrevista de Ricardo Amorim sobre o que é necessário para a economia se recuperar ao longo de 2016

01/2016

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Foto: Ricardo Corrêa

 

Na contramão do que temos ouvido de especialistas políticos e econômicos, empresários e até cidadãos apreensivos com a situação país, o economista mais influente do Brasil segundo a revista Forbes, Ricardo Amorim, traz um discurso mais otimista para o próximo ano e principalmente para o seguinte, apostando na recuperação do país a partir da resolução da crise política, com base em medidas que visam retomar a confiança na economia nacional.

 

De acordo com Amorim, ao menos na economia, 2016 pode ser um ano melhor do que a maioria teme, e, quase com certeza, os anos seguintes serão melhores, talvez muito melhores.

 

Durante estes dois mandatos da presidente Dilma, foram propostas medidas para solucionar problemas a partir da redução da remuneração das empresas. Quais foram as consequências destas para a economia? Foram produtivas?

 

Um exemplo de política econômica adotada pela equipe do ministro Guido Mantega no primeiro mandato da presidente Dilma está ligado ao setor elétrico.

 

Há cerca de quatro anos, o governo diagnosticou corretamente que a energia elétrica brasileira era a mais cara entre as 30 maiores economias mundiais. Algo deveria ser feito para reduzir seu custo. Havia várias razões para a distorção. A mais grave é que a parcela do preço da energia correspondente a impostos pagos pelo consumidor e pelas empresas do setor no Brasil era, disparada, a maior. Em vez de reduzir drasticamente os impostos – o que exigiria corte equivalente dos gastos do governo –, o governo reduziu-os minimamente e exigiu das empresas do setor uma redução no preço de venda ao consumidor como condição para renovar seus contratos de concessão de exploração de serviços. Inicialmente, os preços ao consumidor caíram um pouco. Como o consumo de energia ficou constante, as receitas das empresas do setor também caíram. Infelizmente, os custos para as empresas são pouco flexíveis, já que o maior deles é construir a infraestrutura de geração, transmissão e distribuição da energia. Resultado para as empresas? Receitas menores e custos constantes reduziram a rentabilidade dos investimentos, o que as levou a cortar investimentos, diminuindo o ritmo de expansão de nossa oferta de energia nos anos seguintes. Para piorar, São Pedro parece não ter gostado das mudanças, e as chuvas escassearam em parte do país. Assim, quatro anos depois, não há energia suficiente por falta de investimentos, e para reequilibrar a demanda a um nível mais baixo de oferta, os preços da energia tiveram que dobrar ou até triplicar.

 

Em resumo, políticas econômicas que estimulavam consumo, mas desestimulavam produção, levaram a confiança dos empresários a cair cada vez mais, diminuindo os investimentos produtivos e gerando dois grandes desequilíbrios na economia brasileira.

 

Quais medidas são necessárias para que o Brasil volte a ter investimentos e o crescimento seja retomado?

 

Como em uma família ou uma empresa, só há duas formas de colocar as contas do governo em ordem: cortes de gastos – a ideal em um país onde o total de gastos públicos é um dos mais elevados entre países emergentes, e a qualidade dos serviços públicos, não – ou elevação de impostos.

 

De um ano para cá, o governo já aumentou as alíquotas de alguns impostos, mas até agora isso não foi suficiente nem sequer para contrabalançar a queda na arrecadação por conta da queda do PIB. Em resumo, para colocar as contas públicas em ordem, retomar a confiança, os investimentos e o crescimento do país, o governo ainda precisará cortar mais gastos ou aumentar mais impostos, o que ele não tem conseguido fazer em função da crise política.

 

Quais as expectativas com relação à queda da inflação?

 

A inflação em 2015 será a mais alta em 13 anos. Em 2016 deve cair, mas não o suficiente para atingir o centro da meta, de 4,5%. Aliás, até o teto da meta inflacionária, de 6,5%, corre o risco de ser estourado, o que pode forçar o Banco Central a aumentar ainda mais os juros no começo de 2016.

 

Por outro lado, por conta da recessão, a trajetória de queda da inflação deve continuar em 2017, o que deve criar condições para que os juros caiam entre o final de 2016 e 2017, possibilitando que o crédito e o consumo voltem a crescer e estimulando os investimentos produtivos e a geração de empregos.

 

Quais são suas perspectivas com relação à corrupção do país? Quais as consequências disso na economia?

 

A presidente reelegeu-se com um discurso de que o país ia bem e que inflação, contas externas e contas públicas não eram problemas. Passadas as eleições, os problemas e suas consequências sobre a economia, empregos e salários ficaram evidentes, gerando em muitos a sensação de estelionato eleitoral. Para completar, denúncias generalizadas de corrupção envolvendo líderes do Executivo e do Congresso colaboram para levar a popularidade da presidente a um dígito e endurecer a relação com o Legislativo, que passou a bloquear os projetos necessários para reequilibrar as contas públicas.

 

Aí é que o jogo deve virar ao longo de 2016. Enquanto permanecem a guerra política e o enorme déficit fiscal, os investimentos produtivos no país secam e o desemprego não para de subir – em breve, chegaremos a desemprego de dois dígitos, o dobro do que era um ano. Em tese, esse quadro poderia permanecer por mais três anos, até as eleições de 2018, mas minha impressão é que, muito antes disso – provavelmente ainda em 2016 –, o tecido socioeconômico brasileiro se esgarçaria a tal ponto que conflitos cada vez mais graves emergiriam, tornando o já instável equilíbrio político insustentável.

 

Uma das possibilidades para reverter a paralisia política e da economia é que o Executivo e o Legislativo cheguem a algum acordo que garanta o ajuste fiscal em troca de algum tipo de “imunidade” aos investigados nos escândalos de corrupção, tanto no Executivo quanto no Legislativo, envolvendo governo e oposição. O custo para o país em médio e longo prazo de não apenas perder a oportunidade de acabar com a cultura de aceitação de corrupção, mas até reforçá-la, seria altíssimo. Em curto prazo, no entanto, isso destravaria a economia, permitindo que, pela primeira vez desde a posse da presidente Dilma em 2011, as perspectivas de crescimento para os anos seguintes fossem melhores do que nos anos anteriores.

 

O que torna esta possibilidade menos provável é que, para que ela se materializasse, faltaria combinar com os russos. Ela só seria possível se o Judiciário, que tem se mantido razoavelmente insulado das pressões políticas, fosse controlado ou cooptado.

 

Apesar disso tudo, você afirma que o cenário econômico para 2016 pode ser melhor do que o amplamente anunciado. Como você sustenta esta afirmação?

 

Se a presidente não for capaz de formar uma base de sustentação politica sólida, a crise atual provavelmente continua e se agrava no início de 2016 com a alta do desemprego e uma queda ainda maior da popularidade e base de apoio político da presidente, possivelmente tornando sua manutenção no cargo insustentável. É bom lembrar que o ex-presidente Collor não caiu apenas em função das denúncias de corrupção, mas também por ter popularidade de um dígito e ver seus aliados gradualmente deixando sua base de sustentação, todas características comuns ao atual governo. Nesse caso, um novo presidente provavelmente teria uma base de apoio política mais forte, o que criaria condições para finalizar o ajuste fiscal, retomar a confiança e o crescimento.

 

Portanto, ainda que com consequências de médio e longo prazo e timing e ritmo de recuperação bastante distintos, tanto no caso de queda quanto de permanência de Dilma no poder, é provável que, em algum momento de 2016, ou, na pior das hipóteses, ao longo de 2017, a economia brasileira inicie um processo de recuperação. O ponto fundamental é que, se o governo Dilma não for capaz de fazer o ajuste fiscal e retomar a confiança dos agentes econômicos, parece-me muito difícil que ele consiga se sustentar politicamente por mais três anos.

 

É também provável que, uma vez iniciada, a recuperação econômica seja muito mais vigorosa do que o atualmente projetado pela maioria dos economistas e empresas. As projeções trimestrais para o PIB da maioria dos analistas indicam PIB em queda até o primeiro trimestre de 2016, seguido de estagnação por dois anos depois disso. Acredito que a queda nos próximos trimestres possa ser até mais intensa e talvez dure mais do que projetam os analistas, mas, uma vez resolvidos a crise política e o buraco fiscal e retomada a confiança na economia brasileira, a recuperação, quando vier, será muito mais forte do que projetada pelos analistas. Como no período anterior ao governo Dilma, ao menos por alguns anos, as surpresas econômicas serão positivas, e o crescimento estará em aceleração, ao invés de desaceleração.

 

Aliás, para aproveitar as oportunidades de negócios que essas surpresas positivas trarão, tivemos, recentemente, vários investimentos bilionários de empresas estrangeiras no país, com a francesa Coty comprando parte das operações da Hypermarcas no setor de cosméticos, a americana Omnicom comprando o Grupo ABC, no setor de comunicação, e os chineses da HNA comprando uma participação significativa na Azul, na aviação.

 

Ricardo Amorim é apresentador do Manhattan Connection da Globonews, presidente da Ricam Consultoria, o brasileiro mais influente no LinkedIn, único brasileiro na lista dos melhores e mais importantes palestrantes mundiais do Speakers Corner e o economista mais influente do Brasil segundo a revista Forbes.

 

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