Uma proposta irrecusável para quem acha que o Brasil não precisa de Reforma da Previdência

08/2017

Por Ricardo Amorim

 

 

Os principais argumentos de quem acha que não há necessidade de Reforma da Previdência costumam ser:

 

1. a Previdência não tem déficit, ela tem superávit;

 

2. os problemas são a corrupção nas dívidas das empresas e a DRU;

 

3. os servidores públicos da União, Estados e Municípios merecem se aposentar muito mais cedo e receber benefícios muito maiores do que os trabalhadores da iniciativa privada porque suas contribuições para a Previdência são maiores do que a dos outros.

 

4. O único problema são as megaaposentadorias e pensões de políticos, juízes e do Ministério Público.

 

Tenho uma proposta irrecusável para quem acredita nos argumentos acima.

 

Primeiro, cobramos cada centavo devido pelas empresas. Depois, acabamos com a DRU. Em seguida, acabamos com as megaaposentadorias de políticos, juízes e do Ministério Público às do INSS, igualando-as às regras do INSS. Aí, somamos todas as receitas e verificamos o total da arrecadação. Por fim, já que supostamente a Previdência teria um superávit e que as contribuições seriam compatíveis com os benefícios, redefinimos o benefício de cada um, dividindo o total arrecadado proporcionalmente pelo que cada um contribuiu. Assim, haveria justiça – cada um receberia de acordo com quanto contribuiu – os benefícios supostamente cresceriam – pois o tal superávit da Previdência seria transformado em aumento de benefícios – e as contas da Previdência estariam absolutamente equilibradas.

 

Topa? Se você realmente acredita nos 4 argumentos acima, não há como não topar. Só haveria ganhos… Caso contrário, você tem de reconhecer que os 4 argumentos são falsos.

 

Não há problema nenhum em ser contra a Reforma da Previdência e reconhecer que, na realidade, a Previdência tem um déficit que não para de crescer e que só neste ano será próximo a R$400 bilhões; que a cobrança do pagamento integral da dívida das empresas e municípios tem de acontecer, mas não fará cócegas no déficit; que a DRU não só não tira recursos da Previdência, mas financia o déficit da Previdência; que a contribuição de servidores civis e militares não chega nem perto de bancar os benefícios excessivamente generosos que eles recebem e que o buraco da Previdência do setor público vai muito além de juízes, políticos e do MP. A única coisa é que, neste caso, você precisa também admitir que acha justo que anualmente mais de R$400 bilhões que deveriam ir para Saúde, Educação, etc sejam redirecionados para a Previdência para garantir que os benefícios atuais sejam mantidos, complementando a parte que as contribuições cobrem. Não há nada errado nisso – apesar de eu discordar completamente. O que não dá é para basear a discussão em mentiras.

 

Para quem topou esta reforma e ficou curioso com o que realmente aconteceria com os benefícios, vamos aos números. O primeiro regime de Previdência no Brasil data de 1.888, mas o Regulamento Geral da Previdência Social só foi aprovado em 1960. Nos 57 anos de lá para cá, foi acumulada uma dívida total de empresas com a Previdência, incluindo multas, correção monetária e juros de R$433 bilhões. Se toda esta dívida tivesse sido paga ao longo dos últimos 57 anos, a arrecadação anual teria aumentado em R$7,5 bilhões por ano. Na prática, não há a menor chance de que esta dívida seja integralmente honrada porque R$251 bilhões referem-se a dívidas de empresas falidas, mas se supuséssemos que a dívida será integralmente paga ao longo do mesmo período em que foi contraída, a arrecadação anual do INSS daqui para frente seria R$7,5 bilhões maior.

 

A DRU, por sua vez, não só não retirou recursos da Previdência, mas redirecionou R$167 bilhões do Orçamento Federal para a Previdência. Alguns exemplos de cortes de investimentos que aconteceram em 2017 para cobrir os benefícios previdenciários maiores do que as contribuições: menos R$11 bilhões para infraestrutura, menos R$6 bilhões para Saúde, menos R$5 bilhões para Educação e menos R$6 bilhões para Transportes. Sem a DRU, estes recursos deixariam de ir para a Previdência e voltariam para de onde vieram. A partir daí, a Previdência só poderia efetivamente pagar o que arrecada. O déficit teria de ser eliminado através de redução imediata dos benefícios de quem já está aposentado e de todos que se aposentarem de agora em diante, já que não haveria recursos para bancá-los.

 

No caso do INSS, a arrecadação neste ano será de R$372 bilhões. Somando–se o aumento de arrecadação com o pagamento da dívida das empresas, ela chegaria a R$ 380 bilhões. Os gastos projetados são de R$561 bilhões. Para reduzi-los a R$380 bilhões, os benefícios do INSS teriam de cair em média 32%.

 

No caso dos servidores, a queda de benefícios seria muito maior. No caso dos servidores federais civis, a arrecadação neste ano será de R$36 bilhões e os gastos de R$71 bilhões. Sem os recursos da DRU, os benefícios teriam de ser cortados pela metade. Dos R$35 bilhões de déficit, R$3,6 bilhões vêm do Legislativo, R$8,6 bilhões do Judiciário, R$ 0,6 bilhão do Ministério Público e mais de R$22 bilhões dos demais funcionários públicos. Portanto, adequar as regras de aposentadoria de políticos, juízes e do MP é fundamental, mas não vai poupar os demais funcionários públicos de terem suas regras também adequadas à realidade das receitas.

 

No caso dos militares, a arrecadação é de R$2 bilhões e os gastos de R$40 bilhões. Sem a DRU, os benefícios cairiam 95%.

 

No caso de servidores de Estados e Municípios, o déficit deste ano deve se aproximar de R$ 100 bilhões. Limitando-se os gastos às receitas, os valores dos benefícios cairiam em média 43%, mas as disparidades são enormes. Em alguns estados, como Minas Gerais, Rio Grande Do Sul e Rio de Janeiro, as reduções de benefícios seriam muito superiores a 50%.

 

A assistência social – aqueles que recebem sem nunca ter contribuído – gera um gasto anual de R$53 bilhões, mas sem os recursos da DRU, teria de ser extinta, pois ela não tem nenhuma fonte de recursos próprios.

 

Em todos os casos, sem mudanças de regras de tempo ou valor das contribuições, os valores dos benefícios cairiam ano a ano porque, por razões demográficas – crescimento da expectativa de vida e queda da taxa de natalidade – o número de aposentados cresce muito mais rapidamente do que o de trabalhadores contribuindo para a Previdência. Portanto, o crescimento da receita da Previdência será menor do que o do número de beneficiários, causando uma persistente redução dos benefícios da Previdência.

 

Em resumo, você pode ser contra reformar a Previdência – aumentando prazos de contribuição e reduzindo um pouco as distorções das regras de contribuição e benefícios – mas aí você tem de admitir que acha justo tirar mais de R$400 bilhões por ano de Saúde, Educação, Infraestrutura, Segurança etc para bancar aposentadorias e pensões acima do que os recursos da própria Previdência conseguem bancar.

 

Ricardo Amorimautor do bestseller Depois da Tempestade, apresentador do Manhattan Connection da Globonews, o economista mais influente do Brasil segundo a revista Forbes, o brasileiro mais influente no LinkedInúnico brasileiro entre os melhores palestrantes mundiais do Speakers Corner e ganhador do prêmio Os + Admirados da Imprensa de Economia, Negócios e Finanças.

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