A vitória de Donald Trump coroou o fortalecimento global de movimentos que expressam uma insatisfação generalizada com os políticos. Eleitores mundo afora têm preferido votar pela incerteza. O profeta dos tempos modernos parece ter sido o Palhaço Tiririca com seu bordão de campanha “Pior que tá não fica. Vote no Tiririca.”
Consistentemente, as pesquisas eleitorais erraram e não previram a saída do Reino Unido da União Europeia ̶ o Brexit ̶ nem a derrota do acordo de paz na Colômbia, muito menos a vitória de Trump nas eleições americanas.
Há décadas, a América Latina tem sido terreno fértil para demagogos populistas. Paradoxalmente, quando a América Latina está dando adeus a populistas de esquerda ̶ Kirchner na Argentina e Dilma no Brasil, por exemplo – demagogos populistas de direita ganham espaços a passos rápidos na Europa e nos EUA.
O sucesso recente dos populistas na Europa e nos EUA, e na América Latina desde os anos 80, não é mera coincidência. Ele é consequência de longos períodos de baixo crescimento econômico e forte concentração de renda. Este é o terreno ideal para os vendedores de milagres.
Nestas condições, a extrema esquerda culpa os mais ricos pelas más condições econômicas do resto da população. Nos EUA, o discurso contra o 1% mais rico quase levou à indicação do socialista Bernie Sanders à candidatura pelo partido democrata nas recentes eleições. Discursos semelhantes levaram a extrema esquerda ao poder na Grécia, a um impasse político na Espanha e a um crescimento forte em vários outros países europeus.
Já a extrema direita culpa os estrangeiros e inflama a xenofobia e o ultranacionalismo. Culpar mexicanos, chineses e árabes pelo desemprego dos americanos foi um dos principais pilares que levou à vitória de Trump nas eleições. Responsabilizar os refugiados pelas dificuldades do Reino Unido levou ao Brexit, à atual liderança da extrema direita de Marie Le Pen na campanha eleitoral na França, e a governos de extrema direita na Áustria e na Hungria. Dependendo do resultado do referendo de dezembro, possivelmente a Itália leve ao poder o Movimento Cinco Estrelas, que pretende tirar a Itália da Zona do Euro, no que talvez será o golpe de misericórdia na União Europeia – projeto que, apesar de seus inúmeros defeitos, impulsionou o crescimento econômico e impediu conflitos bélicos na região através de uma conexão comercial, financeira e humana mais estreita entre os países europeus. Nunca é demais lembrar que um cenário de dificuldades econômicas e ultranacionalismo após a Grande Depressão dos anos 30 culminou no final da década na Segunda Guerra Mundial. Hitler, ao seu estilo, foi um dos maiores populistas da História.
Logo quando o Brasil tenta voltar a se abrir ao mundo após sua recente transição política, o nacionalismo isolacionista ganha força de vendaval mundo afora.
Além disso, a eleição de Trump coroa um movimento global contra políticos tradicionais. A rejeição generalizada a eles abre espaço para novas lideranças – populistas ou não. Isto representa tanto uma oportunidade para mudanças necessárias e positivas, quanto o risco de fortalecimento de pretensos salvadores da pátria que oferecem falsas soluções simplórias e sem sacrifícios para um eleitorado sedento por melhoras rápidas e indolores. Este fenômeno ficou claro nas eleições municipais brasileiras e é provável que se repita nas eleições em 2018.
Por fim, a insatisfação generalizada e o analfabetismo econômico e histórico de boa parte do eleitorado mundial têm levado ao poder, através do voto, líderes antidemocráticos que colocam o futuro da própria democracia em risco. Trump, por exemplo, afirmou na véspera de ser eleito que só reconheceria os resultados das eleições se ganhasse. A democracia já viveu dias melhores.
Ricardo Amorim, autor do bestseller Depois da Tempestade, apresentador do Manhattan Connection da Globonews, único brasileiro entre os melhores palestrantes mundiais do Speakers Corner e o economista mais influente do Brasil segundo a revista Forbes.
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