Entrevista de Ricardo Amorim sobre palestra para Associação Comercial de Maringá

ACIM – Associação Comercial de Maringá

08/2013

 
Os analistas acreditam que o PIB do Brasil neste ano deverá ficar entre 2 e 3%. Em 2012, foi de 0,9%. O senhor acredita que vamos ter outro Pibinho? E de quanto será este crescimento?
Infelizmente, teremos outro PIBinho neste ano, sim. Provavelmente, o crescimento ficará mais perto dos 0,9% do ano passado do que dos 3% ainda previstos por alguns analistas. Por conta da desaceleração do crescimento, elevação da inflação e incertezas políticas e econômicas geradas pelas manifestações por todo o país, vários investimentos tem sido postergados. Além disso, a elevação da inflação reduziu o poder de consumo de parte da população.
 
2014 será um ano de crescimento maior da economia brasileira?
Provavelmente, sim, mas para que o crescimento realmente pudesse se acelerar de forma significativa e permanente, o governo teria de atacar de frente as causas estruturais do baixo crescimento dos últimos anos: burocracia e carga tributária excessivas, infraestrutura precária e mão de obra cara e pouco qualificada. Infelizmente, nada disso tem acontecido na magnitude que o país necessita.
 
O dólar ultrapassou a casa de R$ 2,3. Qual a projeção que o senhor faz da cotação da moeda americana até o final do ano? A tendência é que o dólar continue valorizado frente ao real?
Nas próximas semanas e meses é possível que o dólar continue se valorizando em relação ao real porque as forças que causaram a alta até aqui devem persistir: baixo crescimento chinês reduzindo nossas exportações, repatriação de capital por empresas americanas e europeias e expectativa de reversão da forte emissão monetária pelo Banco Central americano. Olhando para os próximos anos, o mais provável é que o dólar volte a cair, assim como caiu após a alta de 2008, à medida que o crescimento chinês e suas importações de matérias primas voltem a crescer e, possivelmente, o banco central americano seja incapaz de reverter o programa de emissão monetária para não abortar uma recuperação da economia americana que ainda é bastante frágil.
 
O BNDES tem sido criticado por ter injetado muito dinheiro nas empresas do Eike Batista e em outras grandes empresas. O senhor concorda que o papel do banco é financiar grandes operações? Qual é a avaliação que o senhor faz da atuação do banco?
O papel do BNDES é financiar o desenvolvimento do país, incluindo grandes operações. Até aí, nada de errado. No entanto, há dois problemas sérios na atuação do BNDES nos últimos anos. O primeiro foi uma aparente escolha de “campeões nacionais”, uma ou poucas empresas em cada setor econômico que receberam aportes desproporcionais do BNDES em nome de criar empresas brasileiras com força suficiente para serem líderes globais. Além de distorcer a competição no mercado brasileiro nestes setores, esta política cria um risco financeiro importante para o BNDES caso estas empresas passem por problemas financeiros, como tem sido o caso do grupo EBX. Além disso, nos últimos anos, a partir de capitalizações anuais de dezenas de bilhões de reais por parte do Tesouro nacional, o BNDES expandiu muito suas operações, o que também aumentou consideravelmente o risco financeiro para o Tesouro e, em última instância, para toda a economia brasileira.
 
A presidente Dilma afirmou na última quarta-feira (dia 7) que a inflação vem caindo e está sob controle. Horas antes o ministro Guido Mantega afirmou que a inflação vai voltar. O país corre risco de enfrentar inflação acima de 6% ao ano? Vamos manter a meta inflacionária?
Nos últimos trimestres, a inflação tem consistentemente se situado acima dos 6%. Pior, como há uma série de aumentos de tarifas públicos ou preços regulados pelo governo represados, haverá uma pressão inflacionária adicional quando estes aumentos inevitavelmente ocorrerem. A meta inflacionária é de 4,5% e não será atingida neste ano, nem provavelmente no ano que vem. O problema é que, como a inflação tem ficado acima da meta com muita frequência, a capacidade da meta funcionar como um imã para a inflação real, influenciando a expectativa dos formadores de preços, é cada vez menor. Isto significa que quanto mais o governo demorar para fazer a inflação voltar à meta, mais agressivas terão de ser as medidas para conseguir fazer isso no futuro, reduzindo mais o crescimento da economia. Aliás, esta já é uma das razões pelas quais teremos mais um PIBinho neste ano e crescimento apenas moderado no ano que vem.
 
A taxa básica de juros, de 8,5%, atingiu o maior patamar desde maio de 2012. A alta da Selic é uma medida acertada do Copom? O relatório Focus aponta que o mercado financeiro projeta a Selic em 9,75% ao ano daqui 12 meses. O senhor concorda que a taxa básica vai continuar aumentando?
Sim. Com a inflação alta e ainda com pressões adicionais muito fortes, como a taxa de câmbio desvalorizada, que encarece produtos importados, permitindo que preços subam no Brasil, os juros terão de continuar a subir no brasil ao longo dos próximos trimestres.
 
O governo aposta no aumento da Selic para o controle inflacionário. Só que os gastos públicos continuam se expandido. Mesmo com as manifestações recentes da população, sobrecarregada com tantos impostos, não houve medidas práticas para a redução dos custos públicos. O senhor acredita que este governo fará mudanças para que a carga tributária não fique cada vez mais pesada?
No Brasil, os juros são altos exatamente para compensar os efeitos de gastos públicos exagerados, que ao colocar muito dinheiro na economia, acabam estimulando a inflação. Pior, como os gastos subiram recentemente, os juros também tiveram de subir para compensá-los. Para que o governo possa reduzir a carga tributária de forma significativa e permanente, ele teria de cortar gastos públicos também de forma significativa e permanente. Como não está fazendo isso, o espaço para redução da carga tributária é muito limitado, senão inexistente.
 
O governo vai licitar estradas com uma taxa de retorno maior. Na sua opinião, as parcerias público-privadas são a melhor forma de resolver os gargalos de infraestrutura? E a taxa de retorno anunciada pelo governo é atrativa para os empresários, conforme acredita o ministro Guido Mantega?
Uma das coisas que causaram uma queda importante dos investimentos nos últimos trimestres foi uma estratégia equivocada do governo de reduzir a rentabilidade das empresas em diversos setores da economia, como elétrico, financeiro, petrolífero e de mineração. Em resposta a isso, empresários destes e de outros setores se retraíram. Esta mesma estratégia equivocada pautou a definição das taxas de retornos nas concessões, levando o governo a oferecer, inicialmente, taxas de retorno baixas demais para os riscos envolvidos nestes investimentos, não gerando interesse em potenciais investidores. Recentemente, o governo elevou estas taxas de retorno, mas como de lá para cá, as perspectivas para crescimento e inflação no Brasil pioraram, exigindo portanto taxas de retorno mais latas dos investimentos para compensá-las, neste momento, não tenho certeza se as novas taxas são suficientes para atrair os investimentos que necessitamos.
 
Há pouco mais de um ano, o senhor falou para a Revista ACIM que o “tamanho verdadeiro do problema da indústria brasileira é imensamente menor do que vem sendo colocado” e que a indústria nacional ganhou espaço no mundo. Os empresários continuam reclamando da falta de competitividade e falando em desindustrialização. O senhor acredita em desindustrialização? E como tornar as indústrias nacionais mais competitivas?
Meus pontos fundamentais eram e continuam sendo dois. O primeiro é que as dificuldades vividas pela indústria nacional não são exclusividades da indústria nacional, mas consequência da emergência da indústria chinesa, que impactou toda a indústria global, inclusive com impactos negativos bem maiores em países desenvolvidos do que no Brasil. Por exemplo, a produção da indústria brasileira está praticamente estganada nos níveis de 2008, o que é grave, mas menos ruim do que a estagnação nos níveis de 2001 ou antes da produção industrial de todos os países desenvolvidos.
O segundo ponto é que a solução para as dificuldades da indústria nacional não é a desvalorização do real, como muitos acreditam. Desde 2004, em todos os anos, a produção da indústria cresceu menos do que as vendas do varejo no Brasil, mostrando que temos um problema de competitividade real. No entanto, a produção da indústria cresceu em todos estes anos, menos 2009 e 2012. Nos dois únicos anos em que o real este em média mais desvalorizado que no ano anterior, a produção da indústria caiu porque o real só se desvaloriza quando há crises na economia mundial – nos EUA em 2009, na Europa no ano passado – que reduzem nossas exportações, mesmo com uma taxa de câmbio mais favorável.
A solução para as dificuldades da indústria passa por resolver os gargalos estruturais para o crescimento brasileiro – burocraria, carga tributária, custos trabalhistas, qualificação da mão de obra, infraestrura, etc…
 
Várias pesquisas apontam a queda da confiança dos brasileiros. Por quê? Os consumidores realmente estão endividados?
O maior problema não é o grau de endividamento do consumidor brasileiro, que ainda é 3 a 4 vezes menor do que nos países que tiveram problemas de excesso de endividamento, mas comprometimento da renda dos consumidores com as prestações destas dívidas, este, sim, muito elevado. Como os consumidores podem comprometer uma parcela muito grande da renda com as prestações se a dívida não é tão grande? Simplesmente porque as taxas de juros no Brasil são ainda muito elevadas e os financiamentos muito curtos, dividindo o pagamento da dívida em um número muito menor de prestações e, portanto fazendo com que as prestações sejam maiores.
 
Ricardo Amorim é apresentador do Manhattan Connection da Globonews, colunista da revista IstoÉ, presidente da Ricam Consultoria, único brasileiro na lista dos melhores e mais importantes palestrantes mundiais do Speakers Corner e economista mais influente do Brasil segundo o Klout.com.Perfil no Twitter: @ricamconsult.
 
 

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