Entrevista de Ricardo Amorim sobre perspectivas para Bolsa no curto, médio e longo prazos.

Papo de Bolsa

Ricardo Amorim

Por: Fernando Biondi

01 de maio de 2011

 

 

Economista formado pela USP e pós-graduado em administração e finanças internacionais pela ESSEC de Paris, Ricardo Amorim é CEO da RICAM Consultoria empresarial, colunista da revista Isto É e um dos apresentadores do programa Manhattan Connection da Globo News. Com passagens pela Europa, EUA e atualmente com escritório em São Paulo, Amorim trabalha na indústria financeira de 1992, atuando como consultor financeiro e de investimentos, além de proferir regularmente palestras sobre negócios e economia mundial com abordagens sobre tendências globais e brasileiras. Exerceu cargo na diretoria do banco WestLB nos EUA  e como  CEO da Concórdia Asset Management no Brasil, dentre outras instituições. 
Na entrevista Amorim expõe suas expectativas para o mercado acionário brasileiro para o curto, médio e longo prazo e discorre sobre commodities, investimentos, mercado global e setores da economia brasileira candidatos a promissores para os próximos anos. 
Qual a sua expectativa para o mercado acionário brasileiro para o Curto, Médio e Longo Prazo? 
O mais provável é que nas próximas semanas o mercado continue a ter o mesmo comportamento que ele teve nos últimos meses, ou seja, ficar andando de lado. Na verdade, faz mais de um ano que o mercado brasileiro anda de lado e acho bastante provável que o curto prazo mantenha desempenho parecido. 
No médio prazo, e por médio prazo considero aqui até o final deste ano, eventualmente até o começo de 2012, acredito que o mercado irá cair, porque a crise européia deve piorar, e provavelmente muito. Deve se tornar uma crise global, e na medida em que ela se transforma em crise mundial, acontecerá como no final de 2008, com mercados acionários em baixa, e baixa forte e rápida. 
Avaliando o longo prazo, alguns anos à frente, acredito que a tendência será de alta, e provavelmente uma alta muito generosa, em razão de alguns fatores importantes.  O primeiro é que cada vez mais a economia mundial é influenciada por países emergentes, em particular Índia, China e Brasil. No ano passado esses países foram os que mais cresceram no mundo. Isso significa que teremos cada vez mais uma demanda maior por matéria prima. No caso da bolsa brasileira, é grande o peso das empresas produtoras e exportadoras de matéria prima; o bom desempenho das commodities levará a Bovespa a novos patamares históricos. O segundo fator é que acredito que teremos uma resposta a essa crise que deve se aprofundar nos países ricos ao longo dos próximos trimestres. Teremos como resposta os bancos centrais desses países tendo que estimular as suas economias, disponibilizando ainda mais dinheiro nos mercados. A conseqüência disso será um processo de alta muito forte nos mercados acionários emergentes, e em particular o brasileiro. 
Essa resposta nos remete a próxima pergunta: Qual a sua avaliação sobre as commodities, em especial as das empresas com ações negociadas na Bovespa? 
Sim, mas como comentei, acho que antes de atingirem níveis de cotações bem mais altos do que os atuais, muito provavelmente veremos as commodities com valores bastante abaixo do que os preços praticados atualmente; isso em razão da crise européia. O que eu diria é que existe perspectivas consideravelmente favoráveis para o longo prazo, entretanto deverá haver durante o percurso algumas pedras pelo caminho. Aliás, pedras grandes, e não deve demorar muito. 
Quais os setores da economia brasileira o senhor destacaria como promissores para os próximos anos? 
Existem vários, como os setores dependentes de crédito. Como disse anteriormente, uma das conseqüências desse aprofundamento da crise dos países ricos será a disponibilidade em abundancia de dinheiro. Durante a crise européia, será o contrário. Faltará dinheiro e esses mesmos setores que acredito que serão os melhores para os próximos anos, devem ser os mais afetados durante o momento de crise intensa, assim como ocorreu em 2008. Em particular, o setor mais dependente de crédito pra conseguir efetuar vendas é o imobiliário, além daqueles que tem produtos com valor unitário alto, como os da indústria automotiva. São expectativas ruins para o curto e médio prazo, mas positivas para o longo prazo. 
Outro setor, o de commodities e agro-negócio também se benificiará da forte demanda proveniente do mercado global, em especial dos países muito populosos como China e índia. Nesses países, são mais de dois bilhões de pessoas, a grande maioria pobres, e quando começarem a melhorar o nível de vida vão consumir mais alimentos, assim como matéria prima para a construção de cidades, visto que ainda são dois países rurais, mas já em fase de crescimento econômico. 
O terceiro foco que destaco é o de consumo doméstico, em particular o de consumo de massa. Há um processo importante no Brasil de emergência social que deve continuar e, pessoas que antes tinham pouco poder de compra estão aumentando seu poder aquisitivo, em conseqüência, consumirão cada vez mais. Esse processo deverá continuar nos próximos anos. 
Como devem proceder as pessoas que não detêm experiência, mas que desejam investir parte dos seus rendimentos? 
Existem várias maneiras, uma delas é repassar a tarefa do investimento para um profissional qualificado. É possível também aplicar através de um fundo de investimento ou mesmo a partir das próprias corretoras que realizam análises de mercado e dão recomendações. Essas são formas mais rápidas para aplicar com melhor eficiência. 
Outra situação é começar a fazer suas próprias aplicações, de preferência com valores pequenos, para que possa entender que parte dos erros que certamente serão cometidos é natural do processo inicial. Poderá assim melhorar a educação financeira e aprimorar seus métodos de investir, ganhando confiança para novas aplicações ao longo do tempo, e quem sabe, até mesmo de maneira mais significativa e agressiva. 
Qual o momento ideal para ingressar no mercado? 
É importante desconfiar do senso comum. O que determina os preços de mercado é basicamente a soma das opiniões dos investidores; aprendi, ao longo dos vinte anos trabalhando nesta área, que o senso comum geralmente está errado, porque as pessoas reagem como manadas e isso têm algumas implicações. Uma delas é que normalmente muitos investidores compram ações após as mesmas já terem valorizado consideravelmente. Da mesma maneira, costumam vender depois de que os ativos já desvalorizaram demais. É comum, após fortes altas, que os preços estejam próximos do pico, e quando caíram demais podem estar próximas de uma base para retomar a alta. 
Citando um exemplo prático, lembro-me que no final de 2008, o Ibovespa estava em 33.000 pontos, depois de ter caído até valores pouco abaixo dos 30.000 pontos, e fiz recomendações de compra. Disse basicamente que deveria ter um movimento muito forte de alta e poucas pessoas acreditaram na recuperação. Quando a bolsa estava próxima de atingir os 50.000 pontos, ou seja, já havia subido consideravelmente, então muitas pessoas e investidores entraram no mercado. 
O que quero dizer com isso, é que quando a maior parte das pessoas estiver com medo, provavelmente esteja surgindo uma boa oportunidade de compra, e quando a maioria dos investidores estiverem eufóricos, então pode ser a hora de ficar preocupado com uma possível  reversão da tendência, de um mercado de alta para baixa. 
O ouro vem renovando máximas históricas no mercado global e o Dólar perdendo força. Qual a sua expectativa para a trajetória da commodity e da moeda norte-americana? 
O ouro deve continuar em elevação nos próximos meses, talvez até mesmo nos próximos anos, em função de ser um ótimo mecanismo de proteção contra incertezas, em particular contra a preocupação de inflação. Os governos dos países ricos devem injetar muito dinheiro no sistema financeiro global, com isso os receios de uma possível alta da inflação devem crescer ao longo dos próximos anos, levando a cotação da commodity a subir mais ainda. Como o ouro está em um processo de alta a quase uma década, e os preços bem mais elevados, certamente ficará num nível de preço tão alto daqui alguns anos, que sofrerá queda abrupta e rápida, após tanta valorização. Mas acho que isso ainda está longe de acontecer, porque o movimento do ouro nos próximos trimestres e poucos anos a frente deve ser de alta. 
Quanto ao Dólar, esse processo de queda tem a ver também com a emissão desta moeda pelo banco central dos EUA. Nos últimos três anos o BC americano quadruplicou a quantidade de Dólares. Na base monetária americana, a moeda é um produto como outro qualquer, que responde a lei da oferta e demanda. Se você quadruplica a oferta de um produto, o preço cai; foi exatamente o que ocorreu com o Dólar, que deverá continuar sua trajetória de baixa ao longo dos próximos anos. 
Com o agravamento da crise européia, transformando-se numa crise global, e porque o maior mercado de moedas seja o do Dólar, assim como ocorreu em 2008 / 2009, poderá subir muito em um período curto, de alguns meses, e não de anos. Poderá subir rapidamente, para depois voltar a seu movimento de queda. Na realidade, o Dólar está em queda no Brasil e no mundo desde 2002. Essa queda foi temporariamente revertida no final de 2008 e posteriormente voltou a cair. Ou seja, continua em queda até que a crise européia se agrave, então sobe rapidamente e depois volta ao processo de baixa nos próximos anos. 
Neste caso de continuidade da queda, há risco do Dólar não permanecer como moeda para lastrear contratos futuros? 
Acho difícil. As chances de isso acontecer nos próximos poucos anos são pequenas, mas as chances de ocorrer nas próximas décadas são imensas. Ainda não há uma alternativa viável para substituir o Dólar, principalmente porque os outros países ricos com moedas fortes, como Japão, Inglaterra, Suíça ou mesmo a Europa, tem problemas parecidos com os dos EUA. 
Não devemos ver nenhum desses países se fortalecendo, o que faz com que eles não sejam alternativas viáveis, e por outro lado, as moedas dos países emergentes têm se fortalecido, mas não tem ainda moedas com credibilidade suficiente, e nem mesmo mercados fortes o suficiente para receberem o montante de dinheiro que seria necessário, e em vários casos tem dificuldades estruturais de convertibilidade. 
O principal candidato a substituir o Dólar é o Yuan Chinês, porém essa moeda, devido a uma série de restrições de fluxos de capitais na China, não tem condição absolutamente nenhuma de exercer esse papel. Vamos caminhar nessa direção, mas será um processo demorado e provavelmente ocorrerá apenas após algumas décadas. 
Recentemente houve troca de comando na Companhia Vale, com rumores de interferência do governo federal. Qual a sua opinião sobre o episódio? 
Acho que ficou mais ou menos claro que essa troca de comando foi em função da posição do governo federal contra o presidente anterior da Vale (Roger Agnelli). Vejo com grande preocupação, assim como devem estar preocupados os acionistas da empresa. 
Se eu estiver certo quanto a intensificação da crise européia, as ações que subiram muito serão as que mais vão sofrer, então acho que, por hora, essa é a maior preocupação. Mas também é preocupante essa intervenção governamental, especialmente para o longo prazo. Pode prejudicar até mesmo na variação dos preços das ações da Petrobras, em razão da ingerência governamental. Mas no curto prazo há outros fatores que podem ter papel mais determinante.

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