Revista Istoé
02/2013
Por Ricardo Amorim
Há dois anos publiquei aqui uma coluna intitulada Diagnóstico Errado. Afirmava que é equivocada a ideia de que as dificuldades da indústria brasileira vem de um real excessivamente valorizado. Baseado nesse diagnóstico errôneo, o governo promoveu uma forte desvalorização da taxa de câmbio no ano passado. Os resultados? A produção industrial caiu 2,7% em 2012, e com o encarecimento dos produtos importados, a inflação de janeiro foi a mais alta desde 2005.
Nos últimos nove anos, a produção da indústria no Brasil cresceu em sete e caiu em dois, 2009 e 2012, os únicos anos em que a taxa de câmbio média se desvalorizou. Se o problema é a cotação do real, por que a indústria sofre exatamente quando o problema diminui? Porque a valorização do câmbio – ainda que efetivamente aumente os desafios para a indústria – não é a causa original de suas dificuldades, mas sim consequência dos mesmos processos globais que tem causado tais dificuldades.
A primeira, causada pela migração da indústria global para a China em função de custos de mão de obra menores, começou após a entrada dos chineses na Organização Mundial do Comércio no final de 2001. Desde então, a produção da indústria chinesa triplicou, a brasileira cresceu menos de 30%, ainda assim um ótimo resultado quando comparado à indústria dos países ricos, que encolheu.
A segunda é a própria crise econômica dos países desenvolvidos desde 2008. Uma consequência inevitável da necessária reversão do excesso de endividamento que provocou tal crise foi o consumo crescendo menos nos países ricos e mais nos emergentes. Com a expansão do crédito e da renda no Brasil, as vendas do varejo cresceram mais do que a produção da nossa indústria em todos os anos desde 2004. Da mesma forma, a queda da renda e do crédito nos países desenvolvidos desacelerou as vendas internas. Isto gerou capacidade ociosa e forçou a indústria deles a redirecionar uma parte crescente da produção para os países onde o consumo está crescendo, os emergentes, incluindo o Brasil.
Estes fatores adversos não vão mudar tão cedo e há pouco que possamos fazer para neutralizá-los diretamente, sem causar efeitos colaterais mais nocivos que eles próprios, como mostra a mal sucedida tentativa de ajudar a indústria desvalorizando o real, que aliás parece estar sendo abandonada.
Não significa que não possamos ou não devamos fortalecer nossa indústria. Muito pelo contrário. Além das dificuldades causadas pela conjuntura externa, todos os setores da economia brasileira enfrentam obstáculos estruturais. A solução para infraestrutura ruim, impostos excessivos, mão de obra mal preparada, burocracia e tantos outros problemas está em nossas mãos, particularmente nas mãos do governo.
Oferecendo isenções tributárias temporárias a alguns subsetores industriais e medidas protecionistas a outros, o governo divide e cala nossos industriais, mas não elimina gargalos estruturais. Em alguns casos, até os agrava. Encarecer a importação de componentes, por exemplo, além de aumentar o preço para os consumidores, piora a situação dos subsetores que os utilizam.
Enquanto o setor privado brasileiro não se unir e exigir do governo um corte brutal de gastos e desperdícios, que permita a redução de impostos e libere recursos para mais investimentos em infraestrutura e educação, as dificuldades da indústria não vão passar. Faço eco a um dos mais famosos gritos de protesto de Marx e Engels: industriais do Brasil, uni-vos!
Ricardo Amorim
Economista, apresentador do programa Manhattan Connection da Globonews e presidente da Ricam Consultoria.