Em entrevista à ADVFN, economista Ricardo Amorim conta sobre 20 anos de experiência com investimentos.

Revista ADVFN

11/2011

Por Francisco Tramujas

 
 
Formado em economia pela Universidade de São Paulo (USP), com pós-graduação em administração e finanças internacionais pela Essec de Paris, Ricardo Amorim atuou na área de mercados emergentes do Société Générale na França.
 
Sobre o seu primeiro dia em um banco, que aconteceu em 1993, Amorim relata: “Tive meu batismo de fogo, pois naquele dia os quatro maiores bancos da Venezuela quebraram e os mercados ficaram muito nervosos.
 
Para completar, o principal operador do banco pediu demissão. Resultado: logo me vi operando em inglês e espanhol, enquanto pedia em francês explicações, conselhos e ajuda para meus colegas do banco, pois tinha pouquíssima noção do que estava fazendo. De tanto estresse, quase desisti de trabalhar em banco já no meu primeiro dia”.
Leia, a seguir, uma entrevista exclusiva da ADVFN InvestMais com o economista Ricardo Amorim, que participa do programa semanal Manhattan Connection, transmitido no Brasil pelo canal pago GloboNews, da Rede Globo.
 
1-Conte-nos um pouquinho do seu início no mercado financeiro? Como tudo começou e qual foi sua maior dificuldade?
Depois de ter trabalhado na área financeira da Rhodia e em uma consultoria econômica em São Paulo, fui para a França fazer uma pós-graduação em Finanças Internacionais pela ESSEC de Paris. Acabando minha pós, fui trabalhar na área de mercados emergentes do Société Générale em Paris. Meu primeiro dia em um banco, em 1993, foi meu batismo de fogo. Neste dia, os quatro maiores bancos da Venezuela quebraram e os mercados ficaram muito nervosos. Para completar, o principal operador do banco pediu demissão. Resultado, logo no primeiro dia, eu me vi operando em inglês e espanhol, enquanto pedia explicações, conselhos e ajuda a meus colegas do banco em francês, pois tinha pouquíssima noção do que estava fazendo. Quase desisti de trabalhar em banco no meu primeiro dia de tanto stress.
 
2- Você investe em ações? Qual foi a sua primeira ação?
Invisto em ações desde 1994. Minha primeira ação foi ELET6. Na época, meus pais haviam vendido uma casa e resolveram aplicar o resultado da venda em ações. Como eu era o homem da família de mercado financeiro, fui encarregado de definir onde investir. Depois de muita análise, concluí que ELET6 tinha um potencial de alta de cerca de 20% para os próximos 12 meses. Uma semana após a compra, a ação subiu pouco mais de 20% e decidimos vendê-la.
Na semana seguinte, ela devolveu os 20% que tinha subido. Na época, não reconheci que os únicos méritos tinham sido escolher bem a ação e ter disciplina para sair do mercado quando o objetivo foi alcançado. Não percebi que ter pegado uma alta tão rápida e tão pouco duradoura foi pura sorte Achei que era gênio e peguei todo capital que tinha no momento e apliquei em uma carteira de seis ações.
Dois meses depois, veio a crise do México, os juros no Brasil subiram a mais de 40% e minha carteira caiu a metade do valor de quando eu tinha feito o investimento. Foi uma tremenda lição de humildade e serviu para me ensinar que o cenário macroeconômico global é absolutamente fundamental na hora de investir.
 
3- Em 2009, quando o mundo enfrentava as primeiras reações do mercado mundial, você afirmou que o índice Bovespa em cinco anos chegaria a 200 mil pontos. Você ainda mantém essa visão?
Minha visão muito positiva para a Bovespa no longo prazo não mudou. Previsões numéricas não tem precisão nenhuma e com esta não é diferente; elas apenas indicam direção e intensidade dos movimentos. Para quem tem curiosidade de onde o número de cerca de 200 mil pontos próximo a meados da década foi calculado projetando um crescimento médio do PIB brasileiro de 5% ao ano, inflação de 5% ao ano e que o a razão P/L no Brasil chegaria a níveis similares aos internacionais em momentos de pico de mercado (bolhas), ou seja, superiores a 25. Isto deve acontecer porque as crises em EUA, Europa e Japão forçarão estes países a emitirem quantidades nunca antes vistas de moeda, que, em grande parte acabarão migrando para Bolsa, imóveis e terra em países emergentes, causando uma forte alta do preço destes ativos.
 
4- Dada a sequência de crises na Europa, em que a Alemanha se vê obrigada a alavancar o continente praticamente sozinha, qual a sua opinião a respeito do futuro do Euro?
Veremos mudanças muito significativas na Zona do Euro e na Europa e, muito provavelmente, elas envolverão crises significativas. Nos últimos anos, escrevi vários artigos sobre o assunto, mostrando que a crise era inevitável:
Interdependência ou morte (09/2011);
Quem avisa amigo é (08/2011);
– Crônica de uma morte anunciada (07/2011); e
A tragédia Europeia (03/2010).
 
Por isso mesmo, desde fevereiro de 2010, quando o Ibovespa estava na faixa de 70 mil pontos, tenho recomendado aos investidores MUITA cautela com a Bolsa:
Bolsa vai cair até os 55 000 pontos antes de se recuperar, diz Ricardo Amorim (02/2010) ;
É hora de vender tudo (05/2010);
Economista Ricardo Amorim prevê cenário desfavorável à Bolsa. (03/2011) .
 
5- A fuga para o dólar? Qual a explicação para essa procura pela moeda norte-americana, justamente num momento em que o país deles tem o maior endividamento público?
Falta de opção. A situação na Europa é muito pior do que nos EUA e os países emergentes não tem mercados líquidos o suficiente para receber recursos deste montante. Além disso, aumentou muito a remessa de lucros das multinacionais instaladas no Brasil, pois perderão dinheiro em seus países de origem e estão sendo forçadas a repatriar capital daqui para lá. Por fim, o início de um processo de queda dos juros tornou o Brasil menos atraente, temporariamente ao investidor estrangeiro. Enquanto os problemas na Europa não forem resolvidos, o dólar continuará em alta, mas nos próximos anos o processo de queda do dólar será retomado e novas mínimas serão atingidas:
Entrevista do consultor Ricardo Amorim à Rádio Bandnews sobre perspectivas para a taxa de câmbio (09/2011).
 
 
6- Cenário macroeconômico. Para onde estamos indo? O que movimenta a economia atualmente. E na sua visão, quais os setores que ganham com esse movimento?
Com o agravamento da crise da Europa se causando uma nova crise financeira global, nosso crescimento será baixíssimo em 2012:
Prepare-se para a próxima crise global enquanto é tempo (12/2010).
 
Por outro lado, não ficarei surpreso se em 2013 batermos o recorde de crescimento de 2010, sustentando um crescimento muito forte em 2014 – ano de Copa do Mundo e eleições.
Na média da década, nosso crescimento deve ser próximo a 5% a.a., que tem sido a média desde 2004 e é o dobro da média dos 25 anos anteriores.
 
7- Se você fosse investidor, quais setores você olharia com bons olhos?
Passados os calotes na Europa e seus impactos negativos sobre os preços de ativos, os setores que mais devem subir de preço são os mesmos que mais devem cair nos próximos meses devido ao agravamento da crise na Europa: aqueles que mais dependem de crédito – em particular o setor imobiliário e bancos de médio porte – e os que mais dependem de demanda externa – em particular, empresas exportadoras de commodities.
Além disso, ações de empresas bastante alavancadas, como as do Grupo EBX, devem sentir mais nos próximos meses, mas também devem subir de forma mais significativa em seguida, da mesma forma que em 2008 e 2009.
 
8- Você acredita em um futuro calote da economia norte-americana?
É possível, mas improvável; o mais provável é uma aceleração da inflação nos EUA, causando forte desvalorização do dólar.
 
9- E como empresário, em que setores investiria no Brasil?
Começaria pelo setor imobiliário, que se beneficia como ninguém da expansão de crédito que deve continuar no país ao longo da década www.invistamelhor.com.br.
Além disso, nosso agronegócio e os setores de commodities devem continuar a se beneficiar da fome chinesa por nossas matérias primas. Por fim, focaria em setores de serviços e comércio voltados a atender o consumo de massa, cuja renda deve continuar a crescer mais do que a da população como um todo.
 
10 – Das empresas com capital aberto há alguma que você acompanhe de perto? O que lhe chama a atenção?
Aconselho investidores brasileiros e estrangeiros em investimentos em Bolsa, o que me força a acompanhar muito de perto nossas principais ações. O que chama a atenção hoje é que, não fosse a provável piora do ambiente internacional com reflexos negativos no Brasil, a maioria de nossas ações já estaria bastante barata, com múltiplos de P/L muito reduzidos. Isto é particularmente verdade no setor siderúrgico.
 
11 – Aos leitores da ADVFN InvestMais que estão na bolsa, qual a sua recomendação com o atual momento da bolsa brasileira?
Se você não saiu até agora e é um investidor de longo prazo que não pretende mexer em seus investimentos pelo menos nos próximos três anos, esqueça a Bolsa e não acompanhe o noticiário nos próximos meses. Caso contrário, você ficará nervoso com as fortes quedas que ainda devem acontecer e, talvez, resolva sair da Bolsa exatamente quando chegar a hora de entrar de forma agressiva. Por outro lado, se você pretende acompanhar o mercado de perto, venda tudo que tem ontem. Você terá níveis de entrada mais atraentes do que os níveis atuais ao longo dos próximos meses, provavelmente, muito mais atraentes:
Economista Ricardo Amorim prevê que Bolsa cairá mais, antes de forte recuperação (07/2011).
 
12- Recomendaria algum livro para quem quer aprofundar seus conhecimentos sobre o mercado financeiro?
Há vários ótimos livros, mas se tivesse de recomendar um só, recomendaria Manias, Pânico e Crashes de Charles Kindleberger.

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