Entrevista de Ricardo Amorim à Associação Brasileira dos Importadores de Máquinas e Equipamentos Industriais sobre palestra sobre perspectivas, oportunidades e desafios para a indústria

04/2015

ABIMEI

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Foto: Ruy Hizatugu
 

O que o Brasil precisa fazer para superar o atraso tecnológico do parque industrial?

 
Investir em inovação e automação, reduzir a burocracia governamental, aumentar as fontes de financiamento e reduzir os custos de investimentos em pesquisa e desenvolvimento e reduzir as barreiras e as taxas de importação de máquinas, equipamentos e tecnologias. A única forma de voltarmos a crescer mais é aumentando muito os investimentos produtivos no país, começando pelos investimentos em infraestrutura e aumentando a produtividade dos trabalhadores brasileiros, investindo em educação, treinamento e inovação. O trabalho de descoberta e valorização de talentos tem de ser feito por cada empresa e passa por reconhecimento financeiro e não financeiro destes talentos, além de oferecer a eles desafios condizentes com suas habilidades.
 
Do ponto de vista do país, a principal tarefa para manter os talentos no país é gerar oportunidades para eles, o que só é possível retomando um ritmo de crescimento mais acelerado. De 2004 a 2010, centenas de milhares de brasileiros que moravam e trabalhavam na Europa, EUA e Japão retornaram ao país, atraídos por melhores oportunidades. Nos últimos, com a desaceleração econômica o processo inverteu-se. Um fator que nos ajuda neste processo de atração de talentos, não só de brasileiros, mas também de estrangeiros é o mau desempenho econômico recente dos países desenvolvidos em geral e, particularmente na Europa. Na Grécia, por exemplo, 85% dos jovens de 18 a 25 anos estão sem emprego. Na Espanha, Itália, Portugal e Irlanda, esta porcentagem é apenas um pouco mais baixa, o que facilita muito para nós a atração de talentos destes países.
 
A produtividade média do trabalhador americano é hoje 5 vezes a do trabalhador brasileiro. Em outras palavras, para executar a mesma função, você pode contratar um americano ou 5 brasileiros. A razão mais óbvia para isso é a melhor qualidade da educação por lá, mas tão importante quanto isso é o fato do trabalhador americano estar muito melhor equipado que o brasileiro. Para executar seu trabalho, ele conta com uma série de ferramentas, máquinas, software e hardware que o brasileiro não conta. Mal comparando, um agricultor com um trator produz mais do que 5 vezes mais do que 5 trabalhadores cada um deles com uma enxada. Precisamos automatizar e mecanizar a economia brasileira, mas isto tem de acontecer em paralelo a um aumento da qualificação da mão de obra. Voltando ao meu exemplo, não basta apenas comprar um trator para um dos 5 trabalhadores que mencionei se ele não souber usar o trator.
 
O baixo crescimento da indústria nacional está relacionado à desaceleração econômica?
 
Desde 2004, as vendas do varejo cresceram mais do que a produção industrial em todos os anos e este quadro deve se repetir em 2015. A competição externa mais aguda na indústria explica porque seu desempenho tem sido sistematicamente inferior ao do varejo. Infraestrutura ruim, impostos altos demais, legislação trabalhista engessada, burocracia excessiva, baixa qualificação da mão de obra prejudicam tanto varejo quanto indústria, mas a indústria sofre mais as consequências porque é mais exposta à competição de empresas estrangeiras, particularmente as chinesas desde 2002 e as americanas e europeias desde 2009. Em outras palavras, o consumo cresceu muito no Brasil nos últimos anos, mas boa parte dele foi suprido por empresas estrangeiras. Em 2006, o Brasil chegou a ter um superávit comercial de US$20 bilhões em produtos manufaturados. Nos últimos 12 meses, tivemos um déficit de US$ 120 bilhões. Por isso, mesmo com o crescimento do consumo e vendas do varejo, a produção da nossa indústria é menor hoje do que era há 6 anos. Felizmente, as regiões mais dependentes da renda do agronegócio, mineração e programas sociais – Centro-Oeste, Nordeste e Norte – têm um desempenho melhor do que a economia brasileira como um todo, mas nas regiões mais industrializadas – Sul e Sudeste – o desempenho da economia é ainda pior do que o do PIB brasileiro, que nos últimos 4 anos já foi o que menos cresceu em toda a América Latina.
 
A que atribuiu o aumento do desemprego no setor industrial?
 
Infelizmente, a indústria, o setor mais produtivo da economia por ser o mais intensivo no uso de máquinas que colaboram para a produtividade do trabalhador ser maior foi o setor mais negativamente impactado por políticas econômicas que nos últimos 12 anos têm privilegiado somente o consumo em detrimento da produção. Por consequência, ele tem perdido participação no PIB e demitido.
 
Para evitar a desindustrialização e garantir o desenvolvimento brasileiro, você concorda que o país não deve priorizar um setor em detrimento de outro?
 
Sim, mas mais do que isso o país não pode apenas estimular consumo sem estimular produção. Nenhum país pode eternamente consumir mais do que produz. Este modelo já se esgotou no Brasil, como a estagnação do PIB no ano passado e a queda neste ano deixam claro. Para voltar a crescer de forma sustentada precisamos estimular a produção, reduzindo o custo de produzir no país.
 
Nos últimos anos, o crescimento brasileiro baseou-se no crescimento da classe média e seu potencial de consumo. A expansão do consumo de massas em si é muito benéfica em termos econômicos e sociais. O problema é que ela não pode ser a única base de crescimento do país e tem sido. Se um país só estimula o consumo e não estimula a produção, acaba acontecendo um desequilíbrio entre forte crescimento da procura por produtos e serviços e crescimento menor da oferta destes produtos e serviços. O resultado é menor crescimento econômico, pressão inflacionária e piora da balança comercial devido a forte aumento das importações. Foi exatamente o que aconteceu no Brasil.
 
Infelizmente, desde 2011, o crescimento econômico tem decepcionado ano após ano e neste ano não tem sido diferente. Em 2012, a maioria dos analistas e economistas acreditava que o PIB cresceria 4,5% neste ano. A estas alturas, as expectativas são de que ele caia mais de 1%. Na economia, o vexame tem sido pior do que foi na Copa. O Brasil está tomando de 8 a -1, neste ano. A inflação está acima de 8% e o crescimento do PIB será negativo.
 
O governo deveria estar focado em reduzir a carga e simplificar a legislação tributária, reformar nossas leis trabalhistas, melhorar nosso ambiente de negócios, reduzindo burocracia e estimulando investimentos privados, aumentar os investimentos em infraestrutura e melhorar a qualidade da educação. Para que tudo isso seja possível, o governo deveria cortar seus gastos para liberar recursos.
 
Qual a situação da indústria brasileira hoje? Quais são os setores da indústria mais desenvolvidos e os que ainda enfrentam os maiores desafios?
 
A indústria manufatureira é a que tem sentido maiores dificuldades há mais tempo. A indústria extrativa teve um desempenho melhor por bastante tempo e a indústria de construção também. Mais recentemente, os setores mais dependentes de crédito são os que mais tem sofrido. É o que sempre acontece quando temos uma crise de confiança como a atual. Por ordem, os setores imobiliário e automotivo são os mais atingidos e que terão um 2015 mais difícil. Nos dois casos, acredito que uma vez retomada a confiança, a recuperação deve ser forte até porque, quando isto acontecer, eles devem se beneficiar da volta ao mercado de um apetite por consumo reprimido a pelo menos dois anos, o que deve contribuir para um crescimento significativo da demanda.
 
Acredito que uma vez passada a crise, a indústria manufatureira deveria sair fortalecida. Há 11 anos, a produção da indústria brasileira cresce menos do que as vendas do varejo em função de políticas econômicas que privilegiavam apenas o consumo e não a produção. Precisamos retomar políticas que melhorem nossa competitividade.
 
No dia 2 de agosto de 2011, ele lançou o Programa Brasil Maior, voltado a aumentar a competitividade da indústria através de maior intervenção governamental. Desde então, a indústria encolheu. Desde o ano passado, o PIB também encolheu.
 
A estagnação reforçou ao menos três lições fundamentais. Primeiro, planejamento e gestão são imprescindíveis se não quisermos viver novas crises hídrica, hidrelétrica e outras. Segundo, um Brasil mais competitivorico e justo requer um Estado menor, menos oneroso à sociedade e mais eficiente. Terceiro, combater implacavelmente a corrupção é função de todo e qualquer governo e deve ocorrer em três frentes.
Para diminuir o volume de recursos acessível aos mal intencionados, precisamos reduzir o tamanho do Estado, sua participação direta na economia e os impostos. Segundo, a transparência das contas e negócios do setor público deve ser total para que a corrupção seja menor. Por fim, quando houver corrupção, as punições têm de ser draconianas.
 
Se o governo, as empresas e cada um de nós aproveitarmos estas oportunidades, este momento difícil da  economia não terá sido perdido.
 
O pré-sal é um segmento-chave para ampliar o investimento e o desenvolvimento sustentado do país?
 
Mais que o pré-sal propriamente dito, um setor de energia competitivo é, sim, um instrumento fundamental para  a competitividade da indústria, como o recente renascimento manufatureiro dos EUA baseado em parte no aumento da oferta e redução dos custos de energia deixou claro.
 
O lucro é função da produtividade da empresa? Elevar a produtividade significa aumentar o lucro e, portanto, a capacidade de sobreviver e crescer?
 
Sem dúvida, no longo prazo o lucro é função da competividade e produtividade da empresa. Em períodos mais curtos, muitas vezes é possível garantir lucros maiores apenas com cortes de custos ou foco em oportunidades passageiras. No Brasil, recentemente, o período de bonança levou muitas empresas a esquecerem seus propósitos e focarem em ganhos de curto prazo. Adeus inovações, melhoria de processos, produtos e serviços ou geração de oportunidades de crescimento para seus colaboradores.
 
As empresas que se perpetuam são aquelas capazes de se fortalecerem em ambientes desafiadores. Nos períodos de seca, os erros das épocas de abundância são expostos. Se corrigidos, não apenas a sobrevivência, mas o sucesso das empresas a longo prazo será garantido.
 
Aliás, é a própria depuração que aumentará as oportunidades para as empresas sobreviventes, que sofrerão menor competição após a depuração do mercado e terão condições de expandir sua lucratividade.
 
Ricardo Amorim é apresentador do Manhattan Connection da Globonews, colunista da revista IstoÉ, presidente da Ricam Consultoria, único brasileiro na lista dos melhores e mais importantes palestrantes mundiais do Speakers Corner e economista mais influente do Brasil segundo a revista Forbes internacional e uma das 100 pessoas mais influentes do Brasil segundo a Forbes Brasil.
 
Siga-o no Twitter: @ricamconsult.
 
 

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